Evola e Weaver (Jeffrey Nyquist – 15 de novembro 2021)
Enquanto Weaver amava o Sul com uma paixão feroz, ele evitava um dos pecados recorrentes dos herdeiros dos Agrários: um seccionalismo estreito que prospera na crença de que tudo teria ido bem ao sul do Potomac se a Confederação tivesse vencido os exércitos da União. Weaver percebia que as enfermidades da civilização ocidental moderna transcendiam a dicotomia entre Norte e Sul. — George M. Curtis & James J. Thompson, Jr. Quem é Julius Evola? Sua carreira foi multifacetada: como filósofo, ele figura entre os principais representantes do Idealismo Italiano... para alguns, ele pode parecer uma éminence grise na política, pois aparentemente Mussolini queria implementar algumas das ideias de Evola para criar mais liberdade em relação às restrições do Nacional-Socialismo... e muitos de seus livros testemunham sua compreensão da alquimia e da magia, sendo relatado que Mussolini tinha um respeito considerável pelos ‘poderes mágicos’ de Evola. — H.T. Hansen Quando um pensador afirma que a civilização tomou o caminho errado, quando diz que a civilização está em processo de desintegração, quando suas simpatias políticas estão com um poder derrotado que tentou estabelecer um padrão diferente de civilização, então esse pensador é um pária. Ele se encontra fora do círculo da “sabedoria recebida.” O que, então, podemos aprender com ele? Sendo um outsider, ele às vezes enxerga o que o resto de nós deixou escapar. Algumas de suas opiniões podem ser repulsivas ou escandalosas, mas ele não deve ser ignorado; pois aqueles que se encontram fora de uma civilização não estão enredados nas vaidades dessa civilização, nem engajados na bajulação enganosa que a sustenta. O pensador que se posiciona fora da civilização, que sofre exílio intelectual, pode ser o único crítico honesto da civilização. Pode ser, de fato, honesto e corajoso o suficiente para jogar água fria sobre nossas cabeças e gritar “vergonha.” Por que, afinal, ele faria tal coisa? Nunca há dinheiro numa carreira assim. Tudo e todos, de fato, se afastam cada vez mais dele. Quaisquer que sejam suas falhas ou tropeços, ele possui seu pequeno canto da verdade. É preciso cautela ao se aproximar dele, é claro. Nunca se deve abordar os párias sem senso crítico. Aproxima-se deles para aprender verdades que exilamos. Aproxima-se com uma única pergunta ardente: o que deixamos de ver? Giulio Cesare Andrea Evola (1898–1974) foi um pagão e inimigo da Igreja Católica que acabou admitindo que a Igreja talvez oferecesse a única solução para a civilização moribunda da Europa. Richard Malcolm Weaver, Jr. (1910–1963) foi professor na Universidade de Chicago, protestante e “agrário” sulista em busca de respostas filosóficas para problemas intratáveis. Evola foi associado ao fascismo italiano, enquanto Weaver foi vinculado aos Estados Confederados da América. Evola foi filósofo e alquimista, enquanto Weaver foi um professor de retórica que defendia “a verdade, a beleza e a bondade” contra “a doutrina fatal do nominalismo.” Evola escreveu sobre a ligação entre a experiência mística e a tradição. Weaver escreveu o que chamava de “uma intuição de uma situação.” Quaisquer que fossem suas diferenças de temperamento ou abordagem, ambos acreditavam na hierarquia. Ambos detestavam o materialismo da modernidade. Ambos criticavam o feminismo, o igualitarismo, o racionalismo e a preguiça intelectual da burguesia. Ambos detestavam as estatísticas sem alma e a política de massas, a feminização dos homens, o colapso da cavalaria e da aristocracia. E, por fim, ambos acreditavam que a modernidade teria um fim desastroso num futuro não muito distante. Esses dois pensadores foram sinais precursores (bellwethers). O notável é que dois escritores, de origens muito diferentes, chegaram a conclusões notavelmente semelhantes sobre a desintegração contínua da civilização. Ambos viam as falhas do liberalismo ocidental. Ambos previam o papel destrutivo do bolchevismo. Ambos afirmavam que a civilização ocidental havia perdido o seu centro. Ademais, seu antiliberalismo era ambíguo, na medida em que ambos valorizavam a liberdade. Evola nunca foi membro do Partido Nacional Fascista e Weaver jamais defendeu a “instituição peculiar” do Sul (isto é, a escravidão). Ainda assim, eram simpatizantes, de certo modo — críticos, mas solidários com causas perdidas de cunho antiliberal. Weaver escreveu um capítulo em seu livro Visions of Order com o título “Forms and Social Cruelty” (“Formas e Crueldade Social”). Cada época, dizia ele, é fundada sobre “formas” que podem levar a uma “idolatria” que rapidamente se converte na destruição de vidas inocentes. O liberalismo, ele advertia, também tem suas idolatrias. “Levado ao seu alcance completo, esse raciocínio mostra que o mundo moderno, por meio de sua cultura maquinal, caiu numa idolatria não menos grave do que a das eras passadas que estamos acostumados a censurar,” observou Weaver. Tanto Weaver quanto Evola tentaram mostrar que a civilização liberal pode ser potencialmente tão brutal quanto qualquer outra. Ambos apontaram para o fenômeno da “guerra total” praticada pelo Ocidente. Não tinham ilusões sobre paz e prosperidade, progresso e ciência. Eram pessimistas econômicos, pessimistas tecnológicos, pessimistas políticos e militares. “Uma terceira guerra mundial, em suas repercussões sociais, acabará por determinar o triunfo do Quarto Estado,” escreveu Evola; “O povo ocidental não está destinado à felicidade que prometeu a si mesmo, mas a algo como a ‘pobreza socialista’ de [Charles] Péguy,” escreveu Weaver. Quando disseram à modernidade que poderia usar a energia nuclear para fins pacíficos, Evola respondeu: “Numa época de dissolução, tal ideia parece completamente abstrata e fantástica, típica de intelectuais sem nenhum senso de realidade.” Como outsiders, Evola e Weaver viram que o Ocidente estava em apuros. Viram que os inimigos do Ocidente — os comunistas — eram pessoas intelectualmente sérias. O materialismo dos comunistas não impedia o comunismo de trabalhar com ideias. Partindo disso, Weaver e Evola tinham uma compreensão mais profunda do comunismo do que outros pensadores. As ideias sempre governaram a humanidade. Os comunistas eram, nos tempos modernos, os que mais levavam as ideias a sério. O Ocidente, por seu lado, demonstrou ser errático no trato com ideias: descuidado, superficial e volúvel. Por ser europeu e por ter previsto o futuro curso de ação da Rússia, os escritos de Evola preocupavam Moscou mais do que os de Weaver. Não é surpreendente, portanto, que os agentes do regime de continuação pós-soviético tenham dado atenção especial àqueles que caíram sob o feitiço de Evola após 1991. Por acaso, o interesse pela obra de Evola tem crescido na Europa. E o que seria mais desastroso para a Rússia do que a Europa reunir-se sob um novo conjunto de ideias? (Por mais bizarras que tais ideias possam parecer.) Bannon, a Direita Europeia e Moscou Nos Estados Unidos, enquanto isso, o velho conservadorismo, com suas virtudes e falhas, foi marginalizado pelo populismo de Trump. Poucos na América perceberam as implicações que brotam da obra de Evola ou Weaver; embora Steve Bannon, que às vezes se reúne com a direita europeia, tenha comentado sobre Evola em 2017. Bannon falou do “conselheiro [Aleksandr Dugin] do presidente Vladimir Putin que remete a Julius Evola... que são, de fato, apoiadores do que se chama de movimento tradicionalista, o qual... se metastatizou no fascismo italiano.” Segundo Bannon, os tradicionalistas “acreditam que ao menos Putin está defendendo instituições tradicionais, e que está tentando fazer isso na forma de nacionalismo.” Bannon então reconheceu que Putin era um capitalista à frente de uma “cleptocracia.” Disse que não estava justificando Putin; mas “acontece que eu acho que a soberania individual de um país é uma coisa boa e forte.” Aqui encontramos Bannon, o principal “intelectual” do grupo de Trump, notando Evola — mas apenas porque os russos notaram Evola primeiro. Bannon talvez se surpreendesse ao saber que Evola não acreditava no tipo de nacionalismo que Bannon defende. Também se surpreenderia ao saber que Evola não era, de fato, um fascista e não acreditava na soberania popular como os americanos acreditam. Evola era um monarquista que acreditava que a soberania vem pela Graça de Deus através de um rei devidamente “consagrado.” Evola explicou que tal rei era mais necessário do que nunca, “especialmente na Europa destes tempos últimos, por causa dos processos involutivos que levaram tanto à organização do mundo moderno quanto ao advento do cristianismo....” Antes e durante a Segunda Guerra Mundial, Evola acompanhou o fascismo italiano na medida em que este se curvava diante do Rei da Itália. Evola nunca se sentiu confortável com a República Social Italiana de 1943-45. (Para os que não estão familiarizados com a política da época: Mussolini foi derrubado pelo Grande Conselho Fascista em julho de 1943. O Conselho pediu ao Rei da Itália que retomasse seus plenos poderes constitucionais, demitisse Mussolini e negociasse a paz com os Aliados. Os alemães rapidamente ocuparam a Itália para impedir essa rendição. Evola foi um dos poucos italianos influentes que foram até o quartel-general de Hitler para discutir a formação de um novo regime italiano. Evola defendeu uma monarquia sob a qual Mussolini serviria como regente; mas Hitler rejeitou essas sugestões, optando por instaurar a República Social Italiana.) É difícil para um americano distraído como Bannon — por mais bem-informado ou astuto que seja — compreender o monarquismo esotérico de Evola. (Eu mesmo não consigo compreendê-lo por completo.) Também é difícil para aqueles que nunca entenderam o comunismo, ou o regime pós-soviético de Moscou, perceber que as ideias monarquistas de Evola jamais teriam lugar no regime de Putin, nem entre seus conselheiros. Aleksandr Dugin é um trapaceiro ideológico e um agente de influência — não um monarquista. Ele pode divertir Bannon, mas não é um brinquedo intelectual. Não podemos levar a sério as ideologias de desvio de Dugin da mesma forma que não podemos acreditar nas declarações do “presidente” Joe Biden. O regime pós-soviético sob Putin ainda é soviético, operado por estruturas secretas do antigo Partido Comunista da União Soviética. Ao mesmo tempo, o regime americano pós-constitucional caminha rumo ao sovietismo, devido às estruturas ocultas dos comunistas e de seus companheiros de viagem nos grandes negócios, na mídia e no governo. De um extremo ao outro do mundo, tudo parece parte da mesma peça. Os americanos, é claro, são lentos para compreender a situação — e os russos querem que permaneça assim. Evola, portanto, é apresentado como um ancestral intelectual do conselheiro de Putin, Aleksandr Dugin. Essa comédia de erros intelectuais, tão difundida do lado americano, sugere que o centro de gravidade intelectual talvez não esteja mais na América neste momento. A Europa poderia realmente recuperar seu senso de identidade através da abdicação intelectual americana? Ciente de que a Europa tenta despertar, Moscou tem enviado um agente atrás do outro para infiltrar a direita europeia. Para enquadrar adequadamente o interesse de Moscou no nacionalismo e no tradicionalismo europeus, vale observar que a exploração do nacionalismo de direita na Europa é uma antiga estratégia soviética, que remonta pelo menos à parceria Hitler-Stalin de agosto de 1939. Anos após o fim dessa parceria, quando o Reich de Hitler caiu em maio de 1945, os serviços especiais soviéticos controlavam uma parte significativa da diáspora nazista que estava transferindo ouro e pessoal da elite para a América do Sul. Trata-se de uma história longa e complicada, com muitas peças faltando. Basta dizer que o GRU e o NKVD conseguiram converter muitos oficiais nazistas em agentes de Stalin, especialmente após a derrota alemã em Stalingrado. Burocratas nazistas com instintos de sobrevivência aguçados entenderam que a Alemanha havia perdido a guerra em Stalingrado e fizeram sua paz com Stalin por baixo dos panos. Portanto, os serviços especiais de Moscou estão no ramo de recrutar nazistas, neonazistas e antissemitas há mais de setenta anos, e vêm manipulando o submundo nazista do pós-guerra desde então. É claro que manter o controle de grupos nazistas e fascistas subterrâneos nunca seria fácil (nem mesmo para a KGB). Nos anos 1950, desenvolveu-se uma luta ideológica entre os direitistas europeus que preferiam a Rússia soviética e aqueles que preferiam a América. (Evola não estava em nenhum dos campos.) Os estrategistas russos calcularam que um ressurgimento do nazismo, ou do antissemitismo, poderia ser útil numa futura crise europeia. Ainda assim, o escritor mais sério e profético a emergir do lado do Eixo na guerra foi Julius Evola — um homem que nunca pertenceu à KGB e não estava sob seu controle. De fato, como já foi mencionado, Evola nunca pertenceu a Mussolini. Como pensador profético, Evola representava uma ameaça por mérito próprio. Evola compreendia o comunismo e antecipou o que ocorreria entre 1989 e 1991. A questão então passou a ser: “Como Moscou poderia se apropriar de Evola para si mesma e, assim, encobrir seus próprios rastros?” Sua associação com o regime de Mussolini tornava Evola explorável. Bastava enfatizar os aspectos “mais úteis” (do ponto de vista de Moscou) da obra de Evola. Assim, Evola poderia ser incorporado a um projeto maior vermelho-marrom. Morto em 1974, ele não podia defender sua obra nem seu contexto. Suas premonições poderiam muito bem ser sequestradas por esoteristas da KGB como Dugin. Evola, é claro, não foi o único alvo desse tipo de jogo. O GRU e a KGB sempre procuraram recrutar intelectuais de direita — especialmente aqueles com anomalias psicológicas, como o principal “teórico” nazista da América, Francis Parker Yockey, autor de Imperium. Não por acaso, Yockey foi um escritor que Evola veio a criticar. Ainda assim, seus escritos compartilham alguns pontos úteis para os projetos russos; especialmente porque Yockey e Evola estavam ambos interessados em arianismo, nas noções de “raças-raízes” de Helena Blavatsky e no conceito hindu do Kali-Yuga (ou Era Sombria), que se esperava trazer grande destruição à humanidade. As teorias geopolíticas de Hitler também estavam conectadas a esses elementos luciferianos por meio da Sociedade Thule. Ciente dessas correntes subterrâneas, Aleksandr Dugin prestou um favor a Putin ao lançar um anzol eurasianista iscado para os incautos morderem. No livro Dreamer of the Day: Francis Parker Yockey and the Post-Fascist International, de Kevin Coogan, descobrimos que Yockey já era um eurasianista mais de meio século antes do surgimento de Aleksandr Dugin (que, segundo seu biógrafo, é uma criatura dos serviços especiais de Moscou). Há indícios de que Yockey teve contato com agentes do bloco comunista, desapareceu na Alemanha Oriental e acabou envolvido com a inteligência soviética. O líder do nazismo americano na década de 1960, George Lincoln Rockwell, mais tarde caracterizou Yockey como um “strasserista” (ou nazista vermelho). Não é por acaso, nesse contexto, que Dugin teve participação na formação do Partido Nacional Bolchevique da Rússia, em 1993, já que o bolchevismo de direita se tornou sua área de especialização. Aqui vemos como o trabalho russo de infiltração e manipulação é preparado por indivíduos talentosos ao longo de muitos anos (através de projetos diversos). Se examinarmos esses fios ideológicos e clandestinos, começamos a perceber a marca de Moscou espreitando por baixo da superfície. Segundo Coogan, um dos amigos mais próximos de Yockey em Wiesbaden, Alemanha, era “um ex-membro altamente condecorado da Luftwaffe chamado Martin Becker.” Fontes da inteligência afirmam que Becker estava “supostamente em contato com o grupo STRASSER,” viajando frequentemente para a Alemanha Oriental e mantendo encontros com os russos. Coogan escreveu: “Tudo o que se sabe com certeza é que Yockey começou a argumentar publicamente em Londres, por volta de 1948, que a Rússia era o mal menor. Mais tarde, Yockey começou a afirmar que a Rússia Soviética não era governada por judeus desde 1937-38. Isso é o mais próximo de um endosso à URSS que qualquer nazista provavelmente daria. De 1955 a 1957, Yockey desapareceu de seus círculos habituais. Em 1956, surgiram indícios de que Yockey estava atuando na Alemanha Oriental. Pelo menos uma fonte bem informada, segundo Coogan, ‘acreditava que Yockey tinha uma ligação estreita com os russos’.” A razão para entrar em tantos detalhes é demonstrar que a conexão entre nazismo e Moscou não é fantasia. Moscou busca constantemente consolidar seu domínio sobre a extrema-direita radical. Trata-se de uma parte muito real de um jogo de longo prazo. Dugin tem sido um agente de influência central nesse jogo. Posando como “filósofo,” Dugin tentou explorar o tradicionalismo esotérico de Evola, afundando-o em uma narrativa tradicionalista fabricada pela Rússia. Para evidenciar a insinceridade de Dugin, Anton Shekhovtsov e Andreas Umland escreveram um artigo, Neo-Eurasianism and Perennial Philosophy, no qual citam Dugin dizendo: “Francamente, eu odeio os tradicionalistas — não importa se são nacionais ou ocidentais. São ralé. Gente de valor faz trabalho de verdade ou trava guerras, mesmo que tenha pouca chance de sucesso.” Os livros e apresentações de Dugin fazem parte de uma grande farsa. Trata-se do mesmo engodo que retrata Putin como defensor dos valores ocidentais e do cristianismo. Essa estratégia coordenada enganou muitos conservadores no Ocidente. É um desdobramento de uma estratégia mais ampla iniciada por Gorbachev entre 1987 e 1991, e depois por Yeltsin. No seu livro Revolta contra o Mundo Moderno, Evola descreveu esse tipo de estratégia como fundamental para o comportamento comunista. Há duas verdades no comunismo, ele advertiu. “A primeira verdade ‘esotérica’ tem caráter dogmático e imutável; corresponde aos princípios básicos da revolução e está formulada nos escritos e nas diretrizes do período bolchevique inicial.” Assim, os pensamentos de Marx e Lenin sempre permanecerão relevantes e sempre estarão em operação. A segunda verdade do comunismo é o que Evola chamou de “verdade realista... forjada caso a caso, muitas vezes em contraste aparente com a primeira verdade, e caracterizada por eventuais compromissos com as ideias do mundo ‘burguês’...” Em outras palavras, o bolchevismo está disposto a mudar sua aparência externa e adotar a democracia, ou o capitalismo, ou até fingir o cristianismo (como Putin tem feito). Evola, portanto, previu que a União Soviética fingiria evoluir rumo a um Estado normal. Adotaria a propriedade privada. Recorreria ao “mito eslavo.” No entanto, advertiu Evola, “As variantes dessa segunda verdade [da dissimulação flexível] geralmente são descartadas assim que cumprem seu objetivo tático; são meros instrumentos a serviço da primeira verdade [o comunismo intransigente]. Portanto, aqueles que caírem nessa armadilha e acreditarem que o bolchevismo é coisa do passado, que ele evoluiu e que está prestes a assumir formas normais de governo e relações internacionais, são de fato extremamente ingênuos.” Ao longo de toda essa análise, Evola caracterizou Lênin como um calculista meticuloso – um “matemático lidando com um problema de cálculo complexo... analisando de forma desapegada e lúcida...”. As massas não são necessárias nesse projeto, escreveu Evola. O método estratégico principal consistia em “uma técnica que exige o emprego de equipes especializadas e bem direcionadas.” A estratégia de Moscou, segundo Evola, participa de uma “coerência ideológica implacável.” Os bolcheviques eram “absolutamente indiferentes às consequências práticas e às inúmeras calamidades que resultavam da aplicação de princípios abstratos; para eles, o ‘homem’ enquanto tal não existia.” Para Evola, o estrategista bolchevique combina “a concentração feroz típica de um fanático com a lógica exata, o método e o foco nos meios mais eficazes típicos de um técnico.” Evola descreveu o comunismo como “prenúncio de uma era em que as forças das trevas já não atuarão nos bastidores, mas se manifestarão abertamente, tendo encontrado sua encarnação mais apropriada em seres nos quais o demonismo se alia a um intelecto lúcido... e a uma forte vontade de poder.” Evola acreditava que as catástrofes decorrentes disso trariam “o fim do ciclo”; ou seja, o fim da própria civilização. Igualmente importante, Evola entendia que o marxismo-leninismo não é, e nunca foi, primariamente uma doutrina econômica. “O elemento primário,” observou ele, “é a negação de todo valor espiritual e transcendente; a filosofia e a sociologia do materialismo histórico são apenas expressões dessa negação e dela derivam, não o contrário, e a correspondente práxis comunista é apenas um dos muitos métodos empregados para executá-la.” Trata-se, portanto, de uma doutrina que “desintegra” o indivíduo dentro do coletivo, negando a alma (que é própria do indivíduo). “No mundo comunista, um objetivo importante é a eliminação no homem de tudo aquilo que possui o valor de personalidade autônoma e de tudo que possa representar um interesse desvinculado das necessidades da coletividade. Mais especificamente, [o comunismo significa] a mecanização, desintelectualização e racionalização de toda atividade, em todos os planos...”. Os insights de Richard Weaver Richard Weaver descreveu os comunistas como “um grupo de elite de teóricos implacáveis que se orgulham de sua liberdade em relação à sentimentalidade.” Assim como Evola, Weaver via os comunistas como claros e lógicos. Ele escreveu: “Nada perturba mais os homens modernos do Ocidente do que a clareza lógica com que os comunistas enfrentam todos os problemas. Quem poderá dizer que esse sentimento não nasce de uma apreensão profunda de que aqui estão os primeiros verdadeiros realistas em centenas de anos, e que nenhum jogo de evasivas no meio-termo salvará o liberalismo ocidental?” Weaver explicou ainda: “Odiando este mundo que não criaram... os comunistas modernos – revolucionários e lógicos – avançam rumo ao rigor intelectual.” Ao mesmo tempo, Weaver enxergava a incapacidade intelectual do Ocidente. Trata-se, segundo ele, de um caso de “psicologia da criança mimada.” Weaver questionou “se o Ocidente permitirá que o conforto o amoleça a ponto de tornar a derrota inevitável, ou se aceitará a regra da dureza e descobrirá meios de disciplina.” Weaver acrescentou: “Os russos, com sua habitual clareza de propósito, fizeram sua escolha; haverá disciplina, e ela será imposta pela elite que controla o Estado.” Afinal, disciplina é necessária para a vitória. Sem disciplina, não há vitória. Mas a disciplina, junto com a crença na autoridade, desmoronou no Ocidente. E então, o que acontecerá se um conflito real ocorrer? “A falha da disciplina nas sociedades empíricas pode ser rastreada até a guerra entre as faculdades produtiva e consumista,” escreveu Weaver. “A criança mimada é simplesmente aquela que foi levada a acreditar que sua faculdade consumista pode prescrever a ordem da sociedade.” Na guerra entre o Oriente e o Ocidente, disse Weaver, o Ocidente liberal está em desvantagem: “Pois, por mais que os bolcheviques tenham se iludido com outras sofismas, eles nunca perderam de vista o fato de que a vida é uma luta. E, como veem a expansão como o preço da sobrevivência, estão totalmente comprometidos com o dinamismo.” Assim, o “céu azul” dos liberais [e conservadores] ocidentais é de fato bastante precário. O que são direitos inalienáveis diante do dinamismo estratégico dos comunistas? O liberalismo ocidental, advertiu Weaver, é fundamentalmente incapaz de pensar. “Mesmo que assumíssemos intenções pacíficas de ambos os lados, o futuro não estaria seguro para o liberalismo ocidental. Sua incapacidade fundamental de pensar, originada de uma incapacidade de ver contradições, o priva do poder de propagação.” Weaver também advertiu que o Ocidente não pode competir com a pobreza socialista. O Ocidente pensa que dinheiro é poder, que dinheiro e riqueza são segurança; mas não, diz Weaver. Dinheiro e riqueza enfraquecem. Considere a seguinte nota de rodapé da história antiga: a Grécia era pobre quando a Pérsia era rica, e ainda assim a Grécia derrotou a Pérsia. Esparta era pobre enquanto Atenas era rica, e mesmo assim Esparta derrotou Atenas. Roma não tinha marinha e era relativamente pobre comparada ao poder comercial de Cartago, e ainda assim Roma derrotou Cartago. Quando Roma se corrompeu pela riqueza, os bárbaros germânicos a derrotaram. A ideia de que a riqueza sempre prevalece na guerra é um conceito do liberalismo capitalista. E também é um conceito do conservadorismo. Um dos problemas que temos, na direita americana, é a noção bizarra de que Ronald Reagan “venceu a Guerra Fria.” Pode-se perguntar, com ironia, como ele fez isso? Indicando Gorbachev como Secretário-Geral do Partido Comunista da União Soviética? Não. Invadindo a pequena Granada? Também não. Construindo um sistema de defesa estratégica com mísseis (SDI)? Não, já que nenhum foi construído. Reagan venceu ao armar os muçulmanos no Afeganistão? Não. E veja quem está armando os muçulmanos agora! O futuro não é seguro para o liberalismo ocidental, disse Weaver. O Ocidente perdeu sua capacidade de pensar. “Líderes demagógicos disseram ao homem comum que ele tem direito a muito mais do que está recebendo; não lhe disseram a verdade mais desagradável de que, a menos que haja expropriação – o aumento deve vir de maior produtividade.” E assim, o Ocidente voltou-se para a mão de obra barata da China. Esse foi o grande truque pelo qual mais poderia ser produzido com menos. Só que isso fez com que a base industrial da América e de boa parte da Europa fosse transferida para a China. O que Weaver diria hoje se pudesse ler os comentários favoráveis a Putin de Patrick Buchanan, Thomas Fleming ou Paul Gottfried? O que Weaver teria dito se tivesse vivido para ver a viagem de Nixon à China comunista? Ele teria acreditado nas mentiras comunistas, como eles acreditaram? Teria aceitado a queda da União Soviética como algo espontâneo e genuíno? Teria mesmo aplaudido Putin como tantos paleoconservadores fazem hoje? Eu penso que não. Conclusão Para ler Weaver e Evola, é preciso aceitar um certo desconforto. Naturalmente, não tenho simpatia alguma pelos Estados Confederados da América nem pela Itália de Mussolini. Cito Weaver e Evola por causa de seus insights brilhantes. Como se vê, o que importa são os insights – não importa quem os tenha. O que precisamos fazer, neste momento, é entender o comunismo. Precisamos encontrar insights sobre o comunismo onde quer que estejam. Isso também significa que deveríamos estar lendo Marx, Lênin, Stalin e Mao. O comunismo está assumindo o controle do mundo, embora ninguém queira ver isso. Uma guerra biológica começou no ano passado, iniciada pelos comunistas chineses. À medida que essa guerra biológica se desenrola, ainda somos incapazes de nomear nosso inimigo ou reconhecer um padrão de avanço totalitário por parte do governo. Há uma estratégia em ação aqui? Sempre houve. Entre nós, o ingênuo do comunismo é confundido com o mestre do comunismo. O bilionário ocidental recebe todo o crédito, como se competência fosse medida apenas por dinheiro. Esquecemos que o bilionário não é um Estado; ele não é uma burocracia cheia de agências de inteligência e centros de pensamento. Ele é apenas uma pessoa com uma conta bancária gorda. Por isso, estamos cercados por teorias da conspiração que só aumentam a confusão pública. Falta-nos compreensão no nível filosófico, e falta-nos compreensão histórica. Sendo preguiçosos, estamos prontos a simplificar demais – a julgar tudo por um clichê. “Ah, sim,” dizemos a nós mesmos. “Tudo se resume a dinheiro.” Assim, compreendemos mal a China. Compreendemos mal Vladimir Putin, que cultivou intencionalmente uma imagem enganosa para que os conservadores acreditem nela. Ele é, como disse Bannon, um “cleptocrata.” Caso encerrado. Acredito que Evola e Weaver entenderam o comunismo. Evola possuía uma compreensão muito especial. Ele destacava o profissionalismo do comunismo. Estava absolutamente certo ao afirmar que os comunistas fingirão compromissos e renunciarão à sua ideologia. Mas então, ele advertia, retornarão aos seus primeiros princípios assim que o compromisso tiver cumprido seu propósito. Dada a qualidade do discernimento de ambos, não creio que Weaver ou Evola teriam confundido Putin com um nacionalista conservador. Ambos teriam enxergado através do cinismo da pose cristã de Putin. Teriam apontado para a declaração de Putin de que o comunismo é semelhante ao cristianismo, mesmo enquanto Lênin era apresentado à semelhança de um santo cristão. Weaver escreveu: “A verdade é ... que nossa rendição à irracionalidade vem acontecendo há muito tempo, e testemunhamos hoje um colapso da comunicação não apenas entre nações e grupos dentro das nações, mas também entre gerações sucessivas.” Perdemos nossa capacidade de pensar, de usar palavras, de comunicar; ou seja, já não somos mais educados. Sendo como crianças, acreditamos naquilo que queremos acreditar. Weaver terminou seu grande livro, Ideas Have Consequences (As Ideias Têm Consequências), da seguinte maneira. Ele disse que era “dever daqueles que podem prever o fim de uma bacanal fazerem conhecidos seus conselhos.” Afirmou que todos estávamos juntos nisso, que ninguém sobreviveria a “uma devastação tão profunda e abrangente quanto o declínio de uma civilização.” Disse: “Se os pensadores do nosso tempo não conseguirem capturar a imaginação do mundo a ponto de provocar alguma transformação profunda, terão de sucumbir junto com ele.” Pode ser, acrescentou Weaver, “que os pecados dos pais sejam visitados sobre as gerações até que a realidade do mal seja novamente reconhecida e surja alguma reação apaixonada.” Parece, nesta hora tardia, que isso é tudo o que resta. Weaver então concluiu: “Se isso for o máximo que podemos esperar, algo em direção a esse renascimento pode ser preparado por atos de pensamento e de vontade neste dia decadente do Ocidente.”