Estratégia Russa e a Crise de Refugiados da Europa (J.R. Nyquist & A. Cernea - 12 de junho de 2024)
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Estratégia Russa e a Crise de Refugiados da Europa (Jeffrey Nyquist - 12 de junho de 2024)
Por J.R. Nyquist e Dra. Anca-Maria Cernea
Introdução
Quarenta anos atrás, um sério problema de longo prazo enfrentado por Moscou era o rápido crescimento da população muçulmana da URSS. Especulava-se então que a alta taxa de natalidade muçulmana transformaria a União Soviética em um país de maioria muçulmana até meados do século XXI. É uma piada estranha — e mais que uma curiosa reviravolta do destino — que a OTAN enfrente hoje esse mesmo problema.
As forças armadas russas entraram oficialmente na Síria em 30 de setembro de 2015. Já estava em andamento uma maciça invasão muçulmana de “refugiados” à Europa, estendendo-se pela primavera e verão daquele ano. Essa onda migratória ocorreu sem uma mudança dramática na crise síria. Segundo um relatório do jornalista investigativo Witold Gadowski, publicado em meados de setembro de 2015, as pessoas então invadindo o coração da Europa incluíam mais do que refugiados — e possivelmente incluíam infiltrados terroristas do ISIS.
Gadowski era um conhecido repórter de guerra, diretor de documentários e vencedor de vários prêmios de jornalismo na Polônia e no exterior. Ele foi à Síria em 2015 e descobriu que, no território controlado pelo Estado Islâmico (ISIS), não havia nenhuma chance de alguém sair sem permissão. Como ele explicou, a punição para quem tentasse escapar era a crucificação.
Na opinião de Gadowski, a onda de refugiados havia sido desencadeada por decisões tomadas em Moscou e talvez em Teerã. De fato, o massacre em massa de civis sírios era um projeto contínuo do ditador sírio apoiado pela Rússia, Bashar al-Assad — cujas tropas matavam sete vezes mais civis do que o ISIS. Com a chegada dos bombardeiros russos, ainda mais civis passaram a ser alvos.
De especial interesse, e contrariamente às declarações públicas, técnicos russos e chineses estavam ocupados ajudando o ISIS a manter seus poços de petróleo e refinarias capturados, enquanto oficiais militares iraquianos treinados pela Rússia (antigos membros do exército de Saddam Hussein) lideravam forças do ISIS contra o governo de Bagdá (governo esse que estabeleceu um quartel-general de inteligência conjunta em aliança com o Irã e a Rússia). A partir disso e de outras evidências, parece que a Rússia tem jogado um jogo duplo no Oriente Médio.
Utilizando a infraestrutura petrolífera do Iraque, e contando com apoio técnico clandestino russo, o ISIS arrecadava 800 milhões de dólares por ano “vendendo mais de 60.000 barris de petróleo por dia.” Mas essa não era a única fonte de renda do Estado Islâmico. Segundo Gadowski:
... o Estado Islâmico comercializa obras de arte e artefatos arqueológicos. Não é verdade que os monumentos da cultura antiga são destruídos. Eles são vendidos e trazem uma grande renda. Em 90 por cento dos casos, isso ocorre por meio da máfia russa. As atividades do Estado Islâmico ... [produziram uma] onda de refugiados que traz lucros para as máfias russa, turca e albanesa.
Neste assunto, a máfia russa não é simplesmente a máfia russa — e o mesmo pode ser dito das organizações mafiosas que surgiram em todo o mundo “ex-comunista”. Conforme observado por Brian Whitmore, da Radio Free Europe/Radio Liberty, “o crime organizado é agora um elemento importante da política de Estado russa.” Segundo Gadowski, o jogo da Rússia é “dar xeque-mate na Europa, e em menor medida nos Estados Unidos.” Exteriormente, a Rússia finge combater o ISIS. Na realidade, a Rússia ajuda o ISIS. Essencial para o plano, os sírios estavam gerando refugiados ao aterrorizar civis na Síria. Como dito acima, Gadowski acreditava que uma unidade secreta terrorista do Estado Islâmico (AMNI) estava colocando assassinos fanáticos entre os refugiados. Dessa forma, uma vasta rede de homens-bomba e assassinos entrou na Europa.
Após sua chegada à Síria, unidades aéreas russas lançaram bombardeios contra civis sírios, aumentando o fluxo de refugiados no fim do verão. É claro que a crise dos refugiados já estava em andamento antes da chegada dos russos. Ela havia atingido o auge anteriormente. O que os bombardeios demonstraram, no entanto, foi a intenção estratégica da Rússia. Os sírios e os russos estavam seguindo um caminho previamente definido. Os bombardeiros foram a cereja do bolo já assado. Muito antes da chegada dos bombardeiros russos, outros meios de pressão haviam sido empregados pela Síria — incluindo o uso de armas químicas. Refugiados (e terroristas) já haviam há muito tempo inundado a vizinha Turquia. Durante a primavera e o verão de 2015, os números aumentavam cada vez mais. Uma proporção significativa dessas massas se dirigiu à Europa. Esta monografia apresentará evidências e argumentos de que a Rússia e seus aliados (Síria e Irã) colocaram esse processo em movimento como parte de um projeto estratégico mais amplo. Os autores acreditam que Moscou não age ao acaso. Ao contrário, seus movimentos são cuidadosamente planejados com antecedência. A estratégia aplicada é complexa, seus objetivos mascarados por desinformação e subterfúgio, chantagem e extorsão, crime organizado e operações terroristas de bandeira falsa.
A Primavera Árabe
Quando rebeliões começaram a irromper no Oriente Médio alguns anos atrás, o ex-chefe da inteligência romena, Ion Mihai Pacepa, se perguntou por que as primeiras rebeliões da série ocorreram “apenas em países islâmicos pró-americanos.” Ele perguntou por que os rebeldes estavam queimando bandeiras americanas. Achou suspeito que os Estados Unidos não tivessem nenhum aviso prévio das manifestações em massa que varreram o mundo árabe, do Marrocos ao Golfo Pérsico. Pacepa observou que “no primeiro dia da revolta no Cairo” os manifestantes “carregavam bandeiras com a foice e o martelo.” Ele chamou isso de “um erro causado por zelo excessivo…”
A rebelião que começou em 17 de dezembro de 2010, na Tunísia, e se espalhou pelo mundo árabe, foi uma tentativa de varrer os regimes árabes “moderados”. Não foi uma revolução por liberdade ou democracia. Como escreveu Richard Miniter em um artigo de 2011 na Forbes, “Praticamente todo elemento da narrativa da mídia [sobre a Primavera Árabe] ... está errado ou é enganoso.” A rebelião não foi uma reação espontânea a ditaduras locais. Segundo Miniter, o chefe da inteligência do Egito alertou o General David Petraeus, em 2010, de que o Irã — aliado próximo e estado cliente de Moscou — estava se preparando para “derrubar o regime de Mubarak [do Egito].”
Miniter foi informado por autoridades da inteligência de que “agentes do Irã estão por trás das manifestações de rua e dos ataques violentos a prédios do governo.” A atividade revolucionária do Irã em toda a região, no entanto, não era meramente iraniana. Essa atividade estava conectada à Rússia, e ao apoio passado da Rússia à causa comunista. Segundo um especialista iraniano, o Líder Supremo do Irã, Ali Khamenei, foi educado em Moscou e pode ser um agente da inteligência russa. Pior ainda, outros líderes importantes do Irã também foram educados na Rússia, mantendo laços atuais com Moscou.
Em um artigo recentemente publicado pelo Instituto Katehon, na Rússia, B. Ozerov explicou que o governo soviético, em 1918, “era guiado pela compreensão do Islã como uma ideologia próxima da doutrina comunista.” Afinal, o Islã favorecia ideais de igualdade, justiça social e redistribuição de riqueza. Segundo Ozerov, o plano inicial de Moscou para a região era “transformar o Islã em uma edição oriental do Comunismo…”
Em uma entrevista de 4 de julho de 1925 ao Tokyo Nichi Nichi Shimbun, o ditador soviético Josef Stalin foi questionado se acreditava que a agitação revolucionária na China, Índia, Pérsia e Egito estava destinada a varrer as potências ocidentais. “Sim, acredito,” disse o líder comunista, que acrescentou que o Ocidente seria “atacado por dois lados — pela retaguarda e pela frente.”
Percepções de V. Kalashnikov e A. Illarionov
Em junho de 2013, J.R. Nyquist entrevistou um oficial dissidente da KGB na Rússia chamado Viktor Kalashnikov. Em referência à Síria, o ex-tenente-coronel da KGB disse: “Tudo se resume à luta contra os Estados Unidos. Todos os aliados são medidos em termos de seu antiamericanismo. Se forem antiamericanos, são nossos amigos.” Kalashnikov então se referiu ao uso de “exércitos terroristas”. Exércitos compostos por terroristas, disse ele, eram melhores do que os antigos exércitos soviéticos de tanques. Eram mais flexíveis e mais baratos que tanques. “O chefe do Estado russo advertiu publicamente o Ocidente de que... entregas de armas à oposição na Síria poderiam resultar em atentados terroristas contra a Europa. Isso é um claro casus belli – uma ameaça terrorista real”, disse Kalashnikov. Quando Nyquist sugeriu que a Guerra Fria havia terminado, Kalashnikov zombou. Esse é outro assunto, ele disse. “Mas temos de perguntar o que aconteceu com a União Soviética em 1991. Ela foi desmontada para fins de reorganização e em nome do poder russo.” Os generais soviéticos não estavam satisfeitos com a situação estratégica. Os grandes exércitos de tanques da União Soviética eram, nas palavras de Kalashnikov, “um ativo em deterioração, especialmente depois de 1983.”
A estratégia central, ele explicou, “era dividir a Europa dos Estados Unidos.” Nos anos 1980, isso foi tentado com a ameaça de guerra. Mas agora, nas circunstâncias atuais, seria necessário idear um método diferente. “O que aconteceu em 11 de setembro foi apenas um presságio do que está por vir”, disse ele.
Na Parte 1 da entrevista com Kalashnikov, intitulada “A aliança islamista da Rússia, planos para destruir a OTAN”, o ex-tenente-coronel da KGB, que fora treinado como estrategista, tentou chamar a atenção do entrevistador para o apoio da Rússia aos partidos anti-imigração na Europa. Aqui, Kalashnikov referiu-se ao Islã como uma arma russa para destruir a OTAN. Ao perceber que o entrevistador estava perplexo, Kalashnikov disse: “Deixe-me falar sobre [os neofascistas] na Hungria. Eles são pró-Putin. São nacionalistas e, claro, absolutamente antissemitas e antiamericanos.”
O que os partidos anti-imigração tinham a ver com “exércitos terroristas” no Oriente Médio? O que tudo isso tinha a ver com a divisão entre a América e a Europa? Eis uma questão que requer consideração cuidadosa. Para respondê-la, pode-se imaginar como a OTAN teria prosperado se Hillary Clinton e Marine Le Pen tivessem vencido suas respectivas eleições. E se a Europa seguisse a liderança da França? Permaneceriam os americanos, politicamente corretos, aliados da nova Europa? “O que eu sugeriria”, disse Kalashnikov,
“é que seus especialistas em antiterrorismo leiam Vladimir Lenin, que forneceu o manual para os terroristas. Como eles devem organizar unidades de combate; quem deve ser morto primeiro e depois; que estratégia e tática adotar. Lenin desenvolveu uma teoria completa para usar o terrorismo como meio de tomar o poder e governar um vasto Estado. Esse foi o início da estratégia soviética, do Estado soviético e de sua política internacional.”
Mais de um ano após essas declarações curiosas de Kalashnikov, um ex-conselheiro econômico do Kremlin chamado Andrei Illarionov fez uma declaração ainda mais surpreendente. Em uma entrevista televisiva de dezembro de 2014, Illarionov observou que a Europa havia atingido seu nível mais baixo de prontidão defensiva. Ele também observou que a Rússia estava ameaçando abertamente o Ocidente com guerra nuclear. Illarionov então fez uma previsão espantosa, acrescentando que “as nações europeias não ficarão muito surpresas, digamos, se na primavera do ano que vem, 2015, houver algum tipo de movimento político em massa – digamos, uma espécie de ‘Primavera Islâmica’.
Sendo ele próprio russo, tendo trabalhado no Kremlin, parece óbvio que Illarionov tinha acesso a fontes de alto nível. A vindoura “Primavera Islâmica”, segundo ele, não ocorreria no Oriente Médio, “mas na Europa.” Ele mencionou efeitos desestabilizadores em “certos países europeus”, onde a crise iria “consumir a energia e a atenção dos líderes europeus num momento em que o Sr. Putin tentaria realizar seu projeto neo-imperial...”
Illarionov foi bastante específico ao dizer que a futura “Primavera Islâmica” na Europa envolveria “movimentos e atividades... nos próprios países europeus.” Quando perguntado se isso poderia ser desencadeado pela Rússia, Illarionov respondeu: “Estou apenas advertindo... quando isso acontecer... as sociedades europeias não devem ficar [muito] chocadas ou surpresas.”
A previsão de Illarionov dá continuidade à sugestão de que Moscou instigou a crise migratória. Pois como mais Illarionov poderia ter sabido sobre uma “Primavera Islâmica” envolvendo “movimentos e atividades... na Europa”? Sua previsão foi um acerto improvável e direto. Saber algo com antecedência é saber que algo está sendo planejado. Illarionov claramente previu o evento mais significativo do ano seguinte. Ele também insinuou que esse evento foi planejado para distrair o Ocidente da agressão da Rússia contra a Ucrânia. E essa previsão encaixa-se perfeitamente com a análise do tenente-coronel Viktor Kalashnikov, residente em Moscou, que alertou sobre a Rússia estar utilizando “exércitos terroristas” já em 2013. O fato é que pessoas em Moscou sabiam o que estava por vir. E por que não saberiam? É preciso um enorme volume de recursos e planejamento real para mover milhões de pessoas do Oriente Médio para o coração da Europa. Muitos indivíduos ligados à KGB precisariam estar cientes com antecedência, nem que fosse apenas para organizar o sistema de transporte necessário.
Percepções de um General Romeno
Aqueles que viveram sob regimes comunistas, que foram formados como estrategistas nesses regimes, estão em melhor posição para avaliar corretamente os eventos recentes do que seus equivalentes da Europa Ocidental. Durante um debate televisionado no programa Adevarul Live, em agosto de 2015, o general aposentado do Exército, Constantin Degeratu, referiu-se à crise de refugiados europeia como uma “guerra híbrida” de agressão, engendrada a partir do Oriente Médio pela Rússia. Superficialmente, observou Degeratu, a crise dos refugiados “encobriu completamente o problema da agressão russa contra a Ucrânia.” Ele então afirmou que toda a operação de refugiados era “bem organizada.” O general acrescentou: “Olhem para as pessoas que estão vindo. Elas estão melhor vestidas e alimentadas do que 10 a 15 por cento da população da Romênia. Trata-se de uma invasão planejada, que não tem causa direta no Oriente Médio...” Em seguida, apontou para as dificuldades logísticas envolvidas em mover milhões de pessoas por centenas ou milhares de quilômetros. “Se alguém vem do Afeganistão com um carrinho até a fronteira da Macedônia, isso exige logística.”
Como para esclarecer a observação anterior de Kalashnikov sobre a Hungria, Degeratu destacou uma anomalia curiosa: “Diz-se que esse aumento de três vezes no número de refugiados em comparação com o verão passado está pegando todos de surpresa. Mas [isso] ocorreu uma semana depois que a Hungria concluiu a construção de [uma grande] cerca fronteiriça. Não lhe parece interessante que primeiro a cerca foi construída e só depois essa migração começou, justamente naquela área?”
O general aposentado Alexandru Grumaz também estava presente no programa. Ele concordou que a migração era “bem sustentada.” Acrescentou que a Turquia também tinha interesse em empurrar os refugiados para a Europa. Era, disse Grumaz, uma crise das instituições europeias. Degeratu acrescentou que o problema da invasão de refugiados não poderia ser resolvido. Por quê? “Porque é gerido pela Rússia e, portanto, não é destinado a ser resolvido, mas sim mantido.” O general então declarou: “O interesse da Rússia é manter essa crise.”
“Está claro,” disse Degeratu, “que, se a União Europeia não quiser viver o pesadelo... que prevê que entre os anos 2030 e 2040 mais de 60 por cento da população ativa da UE será muçulmana... então os países europeus precisam decidir se querem sobreviver como civilização ou não.” De acordo com a avaliação estratégica de Degeratu: “Precisamos compreender que somos o alvo de uma guerra, e podemos chamá-la de híbrida, ou assimétrica, mas essa onda migratória é consequência disso.” Ele então resumiu o custo perigoso dos migrantes para a Europa, observando: “O custo de cada uma dessas pessoas é três vezes maior que a aposentadoria mínima na Romênia!” Certamente, disse Degeratu, “A atitude política [na Europa] em relação a essa situação precisa mudar. Até agora, tem sido uma política de tempos de paz. Agora somos o alvo de uma agressão. O controle de fronteiras é absolutamente obrigatório.”
Segundo o professor Przemysław Żurawski vel Grajewski, que foi convidado pelo Dr. Cernea a comentar as avaliações do general Degeratu, “As opiniões do general Degeratu são plenamente justificadas, e eu subscrevo cada uma de suas declarações….” O professor Żurawski é um dos melhores analistas políticos da Polônia. Leciona ciências sociais na Universidade de Łódz e na Escola Nacional de Administração Pública, atuando também no Conselho Nacional de Desenvolvimento, órgão consultivo do presidente Andrzej Duda. É igualmente conselheiro do atual ministro das Relações Exteriores da Polônia, Jacek Czaputowicz. Segundo o professor Żurawski, os russos não são responsáveis por todos os refugiados que invadiram a Europa, mas é certo que “fizeram o possível para ampliar [o problema] … para confundir a cena política nos países europeus … tanto quanto pudessem. A Rússia é a principal aliada de Assad e do Irã….” Esses aliados da Rússia, disse ele, maximizaram “a escala dos refugiados.” Żurawski também apontou para “as estruturas híbridas e semi-criminosas do FSB/máfias locais na Bósnia e Herzegovina.” Estas também desempenharam um papel no deslocamento de refugiados através dos Bálcãs até o coração da Europa. “A conclusão é,” disse ele, “que a Rússia tinha instrumentos para maximizar os problemas,” apesar da incapacidade da Europa de encontrar “a arma fumegante.”
O professor Żurawski também observou que “Os partidos anti-imigrantes no Ocidente são geralmente pró-Rússia (como a Frente Nacional e o AfD); portanto, aprofundar a crise ajuda os seguidores da Rússia no Ocidente.” Este ponto não deve ser negligenciado. (Kalashnikov já havia insinuado esse fator em sua referência à Hungria mais de um ano antes do início da crise dos refugiados.) Aqui, a manipulação da direita europeia assume o papel central. Moscou tem todos os motivos para acreditar que os partidos europeus anti-imigração ganharão força política à medida que a crise se intensifica. Moscou, portanto, tem razões para investir na direita europeia. Simultaneamente, Moscou também utiliza seus agentes na esquerda europeia. Esses agentes intensificam a crise por meio de políticas “politicamente corretas.” À medida que a esquerda empurra a crise adiante, a oposição de direita cresce e busca aliados prontos – sendo então conduzida aos braços abertos de Moscou.
Esse processo pode já ter sido bem-sucedido na Hungria, onde o primeiro-ministro Viktor Orbán se aproximou de Moscou. O chefe do Estado-Maior das Forças Armadas da Hungria, general Tibor Benkő, afirma que a Hungria não precisa adquirir equipamentos exclusivamente de países da OTAN. A Rússia está atualmente modernizando os helicópteros húngaros Mi-24 e Mi-17 por 64 milhões de dólares. Talvez ainda mais alarmante seja a tolerância do primeiro-ministro Orbán com relação à infiltração russa na direita húngara. Ex-antocomunistas húngaros agora celebram o cosmonauta soviético Yuri Gagarin, dando as mãos a autoridades russas. Segundo os autores Péter Krekó e Lóránt Győri, a Rússia investiu capital político em “grupos de ódio na Europa Central,” com vínculos financeiros “também com organizações violentas da Europa Central e Oriental….” Trata-se de uma estratégia consciente:
“Na caixa de ferramentas de medidas ativas e guerra híbrida de Moscou, as fronteiras entre ferramentas violentas e não violentas estão cada vez mais borradas. E esse processo é bidirecional: não apenas a informação pode ser transformada em arma; organizações violentas podem ser usadas como instrumentos de soft power. O Kremlin é altamente eficaz na infiltração de partidos marginais e organizações paramilitares na Europa Central. São fáceis de comprar ou controlar, pois esses grupos extremistas tendem a ser pequenos e facilmente manipuláveis.”
Qual é o valor estratégico final da infiltração e manipulação de partidos marginais e grupos paramilitares? Tendo essa pergunta em mente, ao observarmos o caos atual no Oriente Médio, o apoio passado da Rússia a organizações terroristas de toda espécie deixa de ser um enigma.
O ex-ministro romeno das Comunicações e Informação,[29] Marius Bostan, foi questionado pelo Dr. Cernea se concordava com as observações do general Degeratu. Bostan respondeu:
“Do ponto de vista da minha própria experiência no serviço público e na política, eu concordo com a opinião do general Degeratu de que é provável que a Rússia tenha estado envolvida na crise migratória e... isso deve ser considerado como uma operação de guerra híbrida contra o Ocidente.”
Bostan enfatizou que “um componente muito importante da guerra híbrida é a dimensão cultural.” Aqui, a Internet desempenha um papel crucial. O investimento de longo prazo da Rússia em “propaganda, desinformação, formação de opinião e comportamento” não pode ser subestimado.
Uma visão de curto prazo seria um erro. Segundo Bostan:
“Há algo na estratégia russa que é difícil de explicar aos nossos aliados ocidentais. É o fato de que a Rússia geralmente atua dos dois lados de um conflito (real ou fabricado). Por exemplo, na Internet, observamos que a propaganda, a desinformação ou a atividade de trolls russos em fóruns e redes sociais normalmente veiculam mensagens destinadas a criar/amplificar conflitos entre diferentes grupos étnicos ou religiosos — romenos contra húngaros, poloneses contra ucranianos, cristãos contra judeus, etc. E eles incentivam, ao mesmo tempo, grupos com visões opostas — tendências antiliberais da extrema esquerda [versus] posições libertárias, direitos LGBT [versus] ativismo cristão conservador, multiculturalismo de fronteiras abertas [versus] movimentos anti-imigração, etc. Assim, a Rússia é capaz de provocar conflitos e crises e de influenciar a agenda pública dos países que visa subverter.”
Essa ambivalência pode parecer paradoxal para as mentes ocidentais, acostumadas a uma lógica binária segundo a qual algo não pode ser preto e branco ao mesmo tempo. Pois bem, os russos não são ocidentais. No Oriente, preto e branco podem ser definidos de muitas maneiras diferentes. Além disso, os líderes russos ainda operam segundo uma mentalidade moldada pela dialética marxista, que afirma que o progresso resulta da luta constante entre elementos contrários.
Parece que o Ocidente está apenas agora descobrindo que, por exemplo, os trolls russos na Internet apoiam simultaneamente uma certa causa e seu contrário.
Bostan delineou uma das estratégias-chave da Rússia. Ele afirma que esse tipo de estratégia é “difícil” de compreender para o Ocidente. Como expressou Rudyard Kipling, “O Oriente é o Oriente, o Ocidente é o Ocidente, e jamais os dois se encontrarão.” Contudo, em algum momento no futuro, o Ocidente terá de aprender a compreender a “estratégia das tesouras” da Rússia — “o fato de que a Rússia geralmente atua dos dois lados de um … conflito.” Se há uma lição central a ser extraída deste estudo, Bostan a destacou.
Em seu artigo no Atlantic Council, From Russia with Hate, Péter Krekó e Lóránt Győri explicam como a contrainteligência polonesa “está atualmente investigando Mateusz Piskorski, líder do partido esquerdista polonês … bem como ex-ativistas do partido de extrema-direita Congresso Polonês da Nova Direita (KNP), sob acusações de espionagem a favor da Rússia.”[31] Eis a clássica “estratégia das tesouras” russa em ação.
Se a crise dos refugiados faz parte de uma estratégia de tesouras russa, de que forma a Rússia se beneficia? Em primeiro lugar, intensificam-se as tensões políticas entre a direita e a esquerda europeias; em segundo, a direita pode ser empurrada na direção de Moscou por meio de diversos mecanismos; em terceiro, ocorre um enfraquecimento geral da OTAN dentro de um cenário de “dividir para conquistar”; em quarto, segue-se uma desmoralização generalizada e perda de confiança nas instituições existentes.
Em sua entrevista ao Epoch Times, em novembro de 2015, o general Degeratu demonstrou a profundidade de sua compreensão ao dizer que devemos “ver quem lucra” com a crise dos refugiados. “Ora,” explicou ele, os russos lucraram, e muitas rachaduras apareceram na OTAN. “Vimos o quão ‘unida’ esteve a Europa,” acrescentou Degeratu com sarcasmo. “Plena unidade! Houve 50 vozes em nossa ‘unidade’ europeia.”
“Aqueles que montaram o exercício [continuou Degeratu] compreenderam todas as nossas fraquezas e as exploraram devidamente. O que mais obtiveram? … Alguém ainda fala sobre a crise ucraniana? Não mais. Há também 1 milhão – na verdade, 800 mil – refugiados, vindos do leste da Ucrânia e da Crimeia, a maioria da região de Donbass. Oitocentos mil. Há 8 mil mortos. Cerca de 2 mil crianças e mulheres grávidas morreram nessa crise. Quase não os vimos nas telas (da TV), não houve manifestações, não houve sessão do Parlamento romeno…”
Degeratu é extraordinariamente perspicaz, e outros especialistas concordam com sua avaliação de que a Rússia está travando uma guerra híbrida contra a Europa. “Talvez alguns de nós sejamos excessivamente voltados ao aspecto militar e façamos perguntas que não deveriam ser feitas,” disse Degeratu.
Testemunho de um General Sírio
Há uma revelação surpreendente no fragmento de uma entrevista de setembro de 2015 concedida a Witold Gadowski pelo general de brigada sírio Ahmad Aljjdeaa, militar com trinta anos de experiência no Exército Sírio e também vice-ministro da Defesa no governo sírio no exílio. Segundo o general Aljjdeaa, “Oficiais russos estão constantemente presentes nos ramos do exército sírio que apoiam o regime de Bashar Assad…” Em seguida, ele acrescentou:
“A Rússia está interessada na confusão na Síria. Existem também quatro centros de treinamento militar na Rússia, onde fanáticos são treinados, os quais então preenchem as fileiras das tropas do Estado Islâmico (ISIS). Entre os treinados, há também chechenos.”
Relacionado a isso, outra manchete curiosa diz: “Ao recuar do Iraque, terroristas do ISIS perderam seus passaportes russos.” Os fatos foram relatados da seguinte maneira:
As forças armadas iraquianas, que no final da semana passada ocuparam o edifício da universidade anteriormente mantido pelo ISIS na cidade de Mossul, exibiram como prova os documentos de identidade dos terroristas do Estado Islâmico, que, em sua maioria, revelaram-se russos.
Mais uma vez, trata-se da “estratégia das tesouras.” Moscou aperfeiçoou a arte de encenar guerras falsas e divisões simuladas com frentes falsas compostas por “idiotas úteis.” O uso de forças terroristas e contraterroristas por parte da Rússia na Síria e no Iraque não deveria surpreender ninguém. Esse procedimento já havia sido empregado durante a Guerra Soviético-Afegã na década de 1980, e novamente durante as recentes guerras na Chechênia.
Neste ponto, pode ser útil recordar um pouco de história. Em julho de 2005, o desertor do KGB/FSB russo Alexander Litvinenko disse ao jornal polonês Rzeczpospolita que Ayman al-Zawahiri (então o segundo no comando da Al-Qaeda) fora treinado pelo FSB no Daguestão, em 1997. Segundo o ex-oficial de inteligência estrangeira do KGB Konstantin Preobrazhensky, Litvinenko “era o responsável por garantir o sigilo da chegada de al-Zawahiri à Rússia … entre 1996 e 1997.”
O desertor da inteligência romena, tenente-general Ion Mihai Pacepa, descreveu em seus livros o uso que Moscou fez de organizações terroristas árabes durante toda a Guerra Fria. Sabemos que a Rússia apoia firmemente o regime islâmico terrorista de Teerã.
O pesquisador Antero Leitzinger explicou: “O terrorismo moderno nasceu em um único ano: 1967–1968. Socialistas internacionais (comunistas) iniciaram a moda simultaneamente em todo o mundo, o que deve nos deixar suspeitos quanto a raízes comuns. Nacional-socialistas [nos regimes arabistas] seguiram o exemplo, transformando marxistas de origem muçulmana em islamistas de origem marxista.”
Entre os associados mais próximos de Khomeini, havia muitos comunistas que, convenientemente, deixaram crescer barbas. Mostafa Ali Chamran havia estudado na Califórnia e no Egito antes de fundar uma sociedade secreta xiita vermelha. Entre seus alunos estavam o futuro ministro das Relações Exteriores Ibrahim Yazdi, o ministro do Petróleo Mohammed Gharazi, e um colega libanês da [Universidade de] Berkeley…, Hussein Shaikh al-Islam, que liderou a ocupação da embaixada dos EUA em Teerã. Essa ocupação, pouco antes da invasão soviética do Afeganistão, direcionou o radicalismo iraniano para o antiamericanismo… Mohammed Beheshti, cuja morte em um atentado a bomba em 28 de junho de 1981 permanece um mistério, havia residido na Alemanha Oriental. O antigo companheiro de Khomeini e ministro das Relações Exteriores, Sadegh Ghotbzadeh, havia colaborado com sucesso com o novo regime. Tanto Ghotbzadeh quanto Chamran haviam recebido treinamento de terroristas palestinos. Quando era estudante nos EUA, Ghotbzadeh foi recrutado pelo GRU [soviético].”
Com relação à Guerra Soviético-Afegã, Leitzinger explicou que a Inteligência Militar Soviética (GRU) havia desenvolvido capacidades especiais no final da década de 1980, especialmente “como manipular islamistas e fazer com que comunistas (da facção Khalq) deixassem crescer barbas e se unissem aos seus inimigos declarados.” Segundo Leitzinger, “Essa ‘estratégia Khalq’ ofereceu uma alternativa bem-sucedida à mais ortodoxa ‘estratégia Parcham’, que dependia de alianças ideológicas menos impuras.”
Leitzinger argumenta que os serviços secretos russos “assumiram controle rígido sobre o terrorismo internacional, e [especialmente] sobre o islamismo” nos anos 1990. O terrorista é, em essência, um tipo especial de agente provocador. Um analista ocidental encontra dificuldade em ver a Guerra Afegã-Soviética ou as guerras da Chechênia como utilizando técnicas de provocação em larga escala. O ex-oficial da CIA T.H. Bagley e o desertor do KGB Peter Deriabin observaram: “A provocação soviética … continua sendo pouco compreendida no Ocidente. Pessoas seguras dentro de um sistema democrático talvez tenham dificuldade em conceber que governantes possam usar sistematicamente técnicas tão hostis contra seus próprios súditos.”
Se as guerras de Moscou no Afeganistão e na Chechênia foram construídas em torno de provocações terroristas, e o objetivo era radicalizar e infiltrar o Islã, e reorientá-lo contra o Ocidente, então essas guerras aparecem sob uma luz mais inteligível. A União Soviética não invadiu o Afeganistão por razões convencionais ou para conquistar controle militar clássico.
Com o advento da crise migratória na Europa, com a probabilidade de que milhares de terroristas estejam infiltrados em meio à massa de refugiados muçulmanos protegidos, o menor sinal de envolvimento russo — ou de envolvimento dos substitutos islamistas da Rússia — deveria provocar uma onda de choque nas estruturas de segurança da Europa. Dada a história da infiltração do Islã por parte de Moscou, e as crescentes evidências do jogo duplo da Rússia, o Kremlin seria o suspeito mais natural em qualquer estudo minucioso da crise migratória. Pode-se argumentar que qualquer outro foco seria irresponsável.
Como relatado pela BBC, o general norte-americano Philip Breedlove, comandante supremo da OTAN na Europa, afirmou que a Rússia e a Síria estavam “deliberadamente transformando a migração em arma, numa tentativa de sobrecarregar as estruturas europeias e romper sua determinação.” Ele citou o uso de bombas de barril por parte da Rússia contra civis sírios. Qual seria o objetivo de ataques tão indiscriminados? O objetivo, disse ele, era “colocá-los na estrada” rumo à Europa.
Massas de pessoas sem-teto, aderindo a uma religião estrangeira, constituem um problema para a Europa. O terrorismo é outro. Desde o início da crise dos refugiados, a Europa tem sido atingida por uma onda sem precedentes de atentados terroristas (sem mencionar estupros, ataques com facas e assaltos). Primeiro vieram os assassinatos em Paris, em novembro de 2015; depois os atentados a bomba em Bruxelas, em março de 2016; em seguida, o ataque com caminhão em Nice e o ataque à igreja na Normandia, em julho de 2016. Depois houve uma série de esfaqueamentos islâmicos por toda a Europa.
Algumas de nossas fontes (citadas acima) alegaram que o terrorismo moderno foi introduzido aos muçulmanos pelo bloco comunista há meio século. Este ponto não deve ser esquecido ao se avaliar o estranho caso de amor da esquerda com o Islã. “Desde o princípio,” disse o ex-tenente-coronel do KGB Konstantin Preobrazhensky, “os chamados bolcheviques, ou comunistas, viam os muçulmanos como a reserva [militar], como o recurso humano para a revolução mundial. Nem todas … as pessoas sabem que o segundo apelo feito por Lenin, após a Grande Revolução Socialista de Outubro em 1917, foi dirigido aos trabalhadores muçulmanos….” Preobrazhensky continuou:
Naquela época, o Islã era a religião dos oprimidos … dos povos colonizados pelo Ocidente. Como disse Lenin por ocasião da … Internacional Comunista, ‘O Ocidente existe às custas do Oriente.’ Ainda hoje podemos ouvir essas conclusões, essas ideias. E assim que a Revolução Russa ocorreu, os muçulmanos russos imediatamente a apoiaram, de modo que organizações militares comunistas muçulmanas foram formadas. Os comunistas muçulmanos destituíam os governos burgueses muçulmanos locais que haviam surgido no Império Russo.
Refugiados na Europa: uma política russa
Somando-se às vozes daqueles que compreendem a estratégia da Rússia, Antoni Rybczynski declarou: “A crise migratória na Europa é, em grande parte, obra da política russa….” Ele afirmou ainda: “Já … quando ninguém esperava os ataques aéreos russos na Síria, Vladimir Putin advertia que a Europa enfrentaria grandes problemas associados ao influxo de imigrantes.” Assim, Moscou apoiava Assad enquanto enfraquecia a Europa.
Outra manchete do Niezalezna.pl refere-se ao “jogo diabólico de Putin: exportando imigrantes muçulmanos para a Europa.” O artigo começa: “As autoridades norueguesas acreditam que a invasão de refugiados em seu país é uma provocação russa.”
Em outubro de 2015, o ministro da Defesa da República Tcheca, Martin Stropnicky, sugeriu que a Rússia talvez estivesse financiando o transporte de refugiados para a Europa. “Embora eu não tenha 100% de certeza sobre essa informação,” disse ele, “também não posso descartá-la.” Dado tudo o que sabemos, sua suposição é lógica. É sensata. Por que a Rússia — que armou terroristas islâmicos por toda a Ásia — não armaria terroristas islâmicos na Alemanha, Grã-Bretanha, França ou Suécia?
Segundo um membro da Liga Nacional de Defesa da Estônia, Ants Laaneots, “O objetivo de Putin é a desintegração da União Europeia e da OTAN, se possível.” A Rússia, acrescentou ele, está promovendo o “euroceticismo.” Mais provavelmente, a estratégia russa inclui muitos objetivos sutis e indiretos. Como na atuação do falecido Mohammad Fahim no Afeganistão, a Rússia pode tomar um país defendido pela OTAN por meio da ação de um criminoso empreendedor. A Rússia pode assim paralisar o coração do Afeganistão ou o coração da Europa de uma maneira que ridiculariza a compaixão europeia.
O presidente do Conselho Supremo da Lituânia, Vytautas Landsbergis, fez uma observação, em 15 de setembro de 2015, sobre a crise dos refugiados que é quase idêntica à de outros que já vimos:
Estava pensando em quem se beneficiaria, e agora sei. Na crise atual, toda a atenção está voltada para a Europa. Ninguém fala mais da Ucrânia, embora haja quase 2 milhões de refugiados também por lá. Putin os expulsou, e ninguém está propondo que vão para onde a vida é melhor….
Segundo Landsbergis, a atual crise migratória é uma ameaça à civilização europeia.
A Europa está diante de um grande perigo para seu próprio sistema, até mesmo para sua civilização. Os alemães, no passado, tinham ilusões de que conseguiriam integrar um milhão de turcos, de que os turcos se tornariam alemães e não haveria problema. Não funcionou. Criaram-se guetos, um Estado dentro do Estado, e esses são grandes problemas….
O deputado ucraniano Anton Gerashchenko, falando no canal de televisão News One, declarou:
A crise de migrantes na Europa surgiu por causa de Putin. A guerra na Síria começou em 2011, mas os migrantes inundaram [a Europa] como um grande rio na primavera de 2015. A Rússia tomou uma decisão depois que a Europa impôs sanções econômicas contra a Rússia: ‘Vamos criar problemas para eles.’ Eles criaram um problema: foi destinado o valor de mil dólares por cabeça de refugiado que fosse levado da Síria para a Europa. Um milhão de refugiados representa um bilhão de dólares. Isso não é nada para Putin….
O custo para a Europa, contudo, é muito mais do que um bilhão de dólares. Gerashchenko acrescentou que uma atmosfera de xenofobia foi criada na Europa, junto com a crescente influência de vários partidos nacionalistas — os quais são conhecidos por sua posição favorável à Rússia de Putin.
Conclusão
Quaisquer que sejam as causas da crise dos refugiados, os estrategistas de Moscou tiraram pleno proveito da situação. Aqueles que conhecem melhor a política russa, situados mais a leste geograficamente, sabem que a Rússia tem algo a ganhar. Se falta uma “arma fumegante” no sentido estrito, há ainda assim uma arma carregada. Pode-se dizer que essa arma está apontada para o coração da Europa.
Quanto à prova, o estrategista não veste um jaleco branco nem segue algum procedimento acadêmico para compreender o mundo. Ele não é um promotor que precisa provar seu caso num tribunal. Ele está engajado em “um duelo em larga escala” — que foi a famosa definição de guerra de Carl von Clausewitz. Se os líderes militares e políticos agissem apenas com base em provas científicas — ou se dependessem de provas usadas para convencer um júri —, eles simplesmente não poderiam agir. O soldado e o estadista exercem julgamento num nível mais próximo do senso comum.
Considere-se a seguinte analogia: se for 2 de dezembro de 1941 e um avião americano avistar seis porta-aviões japoneses movendo-se para o leste entre o Alasca e a Ilha Midway, um estrategista sensato presumiria que os japoneses pretendem atacar a base naval dos EUA em Pearl Harbor. O estrategista sensato seria bastante tolo em declarar que “não havia prova” da intenção japonesa de atacar. Seria pedante, nas circunstâncias, dizer que não há “arma fumegante.” A estratégia dita uma epistemologia completamente diferente. O movimento relatado dos porta-aviões japoneses constituiria uma arma carregada, apontada para a Frota do Pacífico dos EUA. Um líder militar responsável não espera que essa arma dispare. Um almirante americano, tirando as devidas inferências, saberia exatamente o que fazer. Ele alertaria a frota em Pearl Harbor e tomaria contramedidas. Ele saberia, como alguém que comanda frotas, que todo movimento inimigo fala de intenções. Essa deve ser a base de sua certeza, de seu conhecimento prático.
No que diz respeito à crise de refugiados muçulmanos na Europa: relatos sobre campos de treinamento do ISIS na Rússia, relatos de ajuda do GRU/SVR e da máfia russa ao influxo maciço de refugiados, relatos sobre a infiltração russa em organizações terroristas por todo o mundo muçulmano etc., constituem uma arma carregada. Devemos julgar esses relatos como estrategistas — não como cientistas sociais ou acadêmicos. Essa deve ser a base de uma nova metodologia estratégica para o problema dos refugiados muçulmanos. Está claro que isso não diz respeito apenas ao Islã. A participação russa é indicada. A estratégia russa precisa ser compreendida como parte de um conjunto estratégico maior, para que se possa avaliar corretamente a situação como um todo.
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