Sobre o fator "ausência de caráter" na sociedade - caso Arthur Petry
Metidos a espertalhões relativistas são os mesmos que irão te dar facada nas costas e mudar 180º na primeira oportunidade
Existem as realidades físicas, químicas, matemáticas e, ao lado de todas essas coisas, as realidades morais. Qualquer animal humano tem essa capacidade de apreender fenômenos desse tipo, porque ele é dotado de discernimento, ainda que não o coloque em execução.
Todo juízo pressupõe uma vontade de certeza e de se chegar a uma resposta que corresponde aos fatos. As sentenças proferidas fora dessa perspectiva são ocas e podem ser substituídas por quaisquer outras, pois se confessam arbitrárias ou se negam a si próprias.
No caso específico do comediante Arthur Petry, tive a oportunidade de observar suas primeiras manifestações lá por volta de 2015, mas ele já havia começado antes disso. De qualquer maneira, é um tipo bom para explicitar o que pretendo neste momento.
Durante sua fase inicial na internet, o seu relativo sucesso veio justamente do fato de que ele desenvolvia, com uma abordagem original e talentosa, problemas que eram vivenciados pelo público, de viés introvertido, desencantado, revoltado e sem muita esperança na vida. Ele tentava fazer stand up em sua cidade (Porto Alegre), mas não conseguia oportunidades nos locais em que esse tipo de atração era oferecida ao público, então ele resolveu gravar e postar na internet, com vídeos que substituíam as apresentações que ele não conseguia fazer. Disso resultou o começo do seu podcast saco cheio.
Apesar de querer tratar de assuntos num sentido edgy (apelativo), como suicídio, tiroteios de escola, aborto, arremessar um bebê na piscina e observar a reação dos pais (uma brincadeira sobre imaginar cenas improváveis), além de destrinchar as picaretagens feministas, todos esses pontos correspondiam a um fundo de originalidade que coincidia, no mais das vezes, com verdades inconvenientes e abafadas na sociedade, hipocrisias que estavam merecendo o devido desmascaramento.
Ele demonstrava uma capacidade de trabalhar numa perspectiva filosófica assuntos sensíveis, como o suicídio e todos aqueles outros mencionados. Quando, diante do cansaço da vida e desorientação sobre em qual sentido caminhar, o locutor tratava desse tema de maneira leve, como válvula de escape ou carta coringa à disposição de qualquer um. Assim, analisando a questão da morte chegava-se a alguns juízos sobre a vida.
Num estágio mais avançado de atividade, para participar do círculo comum de humoristas e artistas, ele passou por um processo de adaptação, justamente o que fez com que alguns o acusassem de ter se vendido, de ter traído a perspectiva do nicho “do esgoto”, de onde ele surgiu.
A verdade é que o senhor Petry sempre deixou bem claro que não tem bandeiras, não tem convicções, em suma, não tem caráter. Os mais velhos se lembrarão de quando ele criticava aquele programa patético chamado CQC, mas emendava, dizendo que se eles o contratassem, não estaria nem aí, faria parte do programa e cagaria para todas as críticas feitas por ele próprio anteriormente.
Ele também tentou participar de um teste para um programa de rádio chamado Pretinho Básico, cujo humor leve, bobo e convencional contrastava radicalmente com o estilo transgressor e de humor negro que marcava o podcaster Petry, mais próximo de figuras como George Carlin. Os caras do pretinho básico fizeram uma seleção para novos participantes, ele chegou a disputar, mas não conseguiu uma vaga, embora isso tenha rendido conteúdo para os ouvintes.
Ainda em outra oportunidade, ele construiu uma piada boa envolvendo os clichês de autoajuda sobre “não desistir dos sonhos”, em que Petry apresentava um cenário no qual essas palavras encorajadoras eram direcionadas ao neopagão Adolf Hitler, símbolo cristalizado da hediondez. Com isso ridicularizava-se o otimismo raso e enfatizava-se o niilismo que o humorista defendia, aquela palhaçada toda em torno do nada e do vazio e piriri pororó.
Porém, se o comediante sustentava a ausência de sentidos e zombava dos objetivos de vida, ele próprio nunca desistiu dos sonhos dele. Ele fez como o tiririca disse, se uma padaria estiver fechada, vá em outra, se esta estiver fechada, vá em outra, até você conseguir encontrar o seu sonho.
De tentativa em tentativa, o Petry foi se aproximando do mainstream.
Arthur Petry se confessou hipócrita, tomando isso como algo natural e digno, seguindo a linha do mantra segundo o qual “seja o primeiro a se xingar, a partir daí ninguém mais poderá te ofender”. De fato, não ter compromisso com nada é a melhor maneira de se defender de ter traído alguma coisa, e essa acusação nenhum fã dele pode fazer, porque todos os elementos sobre mudanças radicais foram dados ao longo de todos os seus episódios de podcast.
Aparentemente, o público chocado desconhece as implicações sobre o que é não ter caráter, por isso se espantou. Por isso esperava que, ao xingar comediantes famosos e genéricos, isso seria um indicativo de que o próprio crítico não se tornasse um deles no futuro e, pior, aceitasse pagar pedágio ideológico sem nenhum peso na consciência. Esses fãs nutriam como que uma expectativa de que o seu ídolo mantivesse uma identidade harmônica com um nicho específico de ouvintes.
Apesar da carga reflexiva, o podcast era predominantemente um entretenimento. Era uma sessão de relaxamento e ela passou, assim como aquele Petry com o qual o público nutria afeição.
E aqui se entrelaça o paradoxo do público niilista desse comediante com o desvio moral que gerou o estranhamento. Afinal de contas, se se afirma o nada, não se pode esperar coerência alguma, as constantes mutações de humores e formas são todas elas a mesma coisa ou não fazem diferença entre si.
A moralidade constitui um pressuposto filosófico e base de cálculo para a tomada de ações na vida real, o que é o mesmo que dizer que as pessoas que fingem que ela não existe estão sempre aptas a tirar proveito de situações, sempre que o cálculo utilitarista pessoal assim justifique. Isso gera uma tendência de “racionalizar” determinados comportamentos. O referido humorista não havia se vendido porque ninguém tinha aparecido para comprá-lo, mas na primeira oportunidade ele de fato fez aquilo que já indicava, procedeu a uma remodelação radical do seu modo de pensar, agir e falar.
Antes de ser tomada como ofensa, a falta de caráter é um dado. Sim, existem pessoas que simplesmente não têm caráter, não desenvolvem esse aspecto nobre da humanidade e vivem como animais da savana. Essas pessoas se modificam conforme o meio, se você mudar o meio, muda também a pessoa.
Isso é um grande indicativo de que precisam ser identificadas e não merecem confiança para assuntos sensíveis e negócios arriscados.
Com esses tipos, resta somente manter uma relação de mutualismo, ou seja, “uma relação simbiótica entre duas espécies diferentes em que ambas se beneficiam mutuamente, obtendo vantagens como alimento, proteção ou transporte”, essas pessoas devem ser tratadas com máxima frieza e racionalidade. Confiança? Nunca.
Se você tiver um amigo, conhecido ou sócio que considere o certo e o errado como questões de fundo falso, a traição e a mentira estarão sempre na espreita, uma carta na manga a ser usada a qualquer tempo a depender do preço certo, primeiro a conveniência, a justificativa falsa pode vir depois.
Um exemplo disso é o caso de um ex-parceiro do senhor Petry. Esse parceiro, movido por uma lealdade quase canina, admirava-o profundamente, comparando-o ao garoto mais velho da rua que sabe tocar guitarra e inspira os mais novos. No entanto, em um momento de crise, esse, que aos olhos de todos parecia ser um amigo do podcaster, teve de traçar seu próprio caminho.
A questão da falta de caráter, da disposição de se entregar para o provedor de bananas do momento, isso é uma das coisas que devem acender o alerta nas mentes aguçadas e eu acredito que ninguém aqui deseja ser imbecil, todos queremos ter a mente aguçada e identificar filhos da puta em ato e aqueles que, não sendo filhos da puta em ato, o são em potência.
Por isso, é de se pensar como existe essa aberração, que de tão comum na multidão, acaba ficando invisível. Sim, os sem caráter são um problema de saúde pública, se existe algum tipo de consciência coletiva, ela inteira pode ser falseada graças a tipos como esse e a sociedade transformada num festival de sonâmbulos oportunistas. Assim não se faz civilização.
Como diria o escritor, “Quem mente a si mesmo e ouve as suas próprias mentiras chega a um ponto tal que já não distingue qualquer verdade em si nem à sua volta, deixando por isso de se respeitar a si mesmo e aos outros."
Foi assim que Petry, cujo caso venho utilizando como exemplo, chegou ao ponto de se transformar em um indivíduo que, inicialmente defensor da liberdade de expressão, passou a afirmar que a censura de plataformas digitais seria benéfica. Essa opinião, alinhada aos interesses do regime vigente, não representa riscos financeiros ou jurídicos para ele, pois coincide com as posições governistas. O processo de alinhamento que os poderes imprimem sobre as massas modeláveis foi feito com sucesso ao ponto de as criaturas pensarem que suas ideias brotaram de suas próprias cabeças. Há tempo para palhaços e há tempo para coisas sérias. Existe tempo, sobretudo, para deixar de ser palhaço.
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