Nacional-bolchevismo, Neorreacionarismo e Guerra Nuclear (Jeffrey Nyquist - 19/04/2025)
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Nacional-bolchevismo, Neorreacionarismo e Guerra Nuclear (Jeffrey Nyquist – 19/04/2025)
“Em resumo, então, o que Dugin propõe é que o nacional-bolchevismo extrai da ‘metafísica’ do marxismo um gnosticismo e misticismo secretos, iniciáticos, que busca realizar uma alquimia espiritual para transformar a sociedade – o Bolchevismo Nacional torna-se, assim, uma sociedade secreta voltada para uma transformação mágica, teúrgica da realidade.”
James D. Heiser
Em primeiro lugar, para estabelecer a Europa de Lisboa a Vladivostok sob o domínio de Moscou, ou os Estados Unidos devem ser destruídos, ou devem abandonar a Europa. Para realizar isso, seria necessário uma estratégia econômica; em segundo lugar, uma estratégia de guerra informacional; e, em terceiro, seria preciso uma estratégia de guerra.
A estratégia econômica é simples. Destruir o dólar como moeda de troca global. A guerra informacional é a parte mais difícil e complexa da estratégia. Mas a guerra informacional não funcionará se não houver uma estratégia militar. E a estratégia militar-chave necessária é a nuclear. O que quase todos os observadores deixam de perceber é a importância da guerra nuclear em qualquer tentativa de deslocar os Estados Unidos como potência hegemônica mundial. As armas nucleares também são importantes se o objetivo for convencer os Estados Unidos a recuar e permitir que a Rússia domine a Europa. A maioria das pessoas no Ocidente é doutrinada a acreditar que armas nucleares significam o “fim de toda a vida”. Isso é um mito. Como observou o ex-analista da CIA Peter Pry em 1990, “é possível argumentar que ataques nucleares de contraforça em larga escala podem ser executados limitando-se as fatalidades a poucos milhões, ou mesmo a centenas de milhares.”
Segundo Joseph D. Douglass Jr., a guerra nuclear tática é parte integrante dos preparativos de guerra de Moscou. É por isso que a qualidade das tropas russas é irrelevante para os estrategistas do Kremlin. Não faz sentido investir demais no treinamento e no equipamento de tropas que serão submetidas a ataques nucleares. Douglass escreveu o seguinte:
“O combate recebe prioridade máxima na abordagem soviética às armas nucleares táticas. Os … [russos] veem as armas nucleares como meios poderosos e eficazes de combate tático. O Comitê Central do Partido Comunista da União Soviética adotou e promulgou uma doutrina de guerra fortemente ofensiva e orientada para o uso de armas nucleares. A estratégia militar soviética é claramente ofensiva, com as armas nucleares desempenhando o papel principal. E, as forças são direcionadas a projetar, equipar e planejar para lutar uma guerra nuclear.”
O lado americano, observou Douglass, vê os armamentos nucleares como algo “teórico”. Os mísseis nucleares não são seriamente planejados para uso real. As armas nucleares são, para os americanos, inteiramente voltadas para a dissuasão. Claro, os russos nunca concordaram com essa ideia. Moscou dá grande ênfase ao ataque surpresa. Em toda a literatura militar russa, “a importância da surpresa e a necessidade de sigilo são temas principais e recorrentes. De fato, a surpresa que pega o inimigo desprevenido, inclusive com o uso de armas nucleares, é tão importante quanto a força total do ataque.”
O conceito de combate de Moscou pode ser descrito como “um ataque nuclear massivo, em profundidade, surpresa, em conjunto com uma exploração aérea e terrestre imediata e de alta velocidade…”. Segundo Douglass:
“[Moscou pretende] atacar primeiro com um ataque nuclear massivo e em profundidade. Esse ataque é projetado para: (1) destruir os meios da OTAN de contra-ataque nuclear, (2) destruir os principais agrupamentos de forças de combate e seus sistemas de comando/controle, (3) isolar o campo de batalha, e (4) romper a defesa principal e definir os corredores de ataque principais.”
Se é assim que a próxima guerra será travada, que tipo de guerra informacional você conduziria? Tentaria convencer os americanos de que as armas nucleares são inúteis? Tentaria convencer a todos de que armas nucleares são ambientalmente destrutivas demais para serem usadas? Obviamente que sim – e é exatamente isso que os inimigos da América têm feito.
Ainda assim, a coisa mais importante em uma guerra é saber quem é seu inimigo. A coisa mais importante em uma guerra informacional talvez seja semear confusão a respeito de quem são os amigos e quem são os inimigos. Por meio da criação de muitas narrativas confusas, os defensores tradicionais da América poderiam ser divididos. Por exemplo, a direita americana sempre demonstrou maior comprometimento com a defesa nacional do que a esquerda. Segue-se, portanto, que uma guerra informacional anterior a uma guerra mundial tenderia a ter como alvo a direita.
Hoje, a direita americana já não percebe uma conexão clara entre ameaças externas e ameaças internas. Enquanto a esquerda foi, outrora, o principal canal de infiltração e subversão inimiga, hoje temos razões para nos preocupar com a direita. Enquanto a esquerda simpatizava com nossos inimigos comunistas no Vietnã durante os anos 1960, a direita tende hoje a simpatizar com a Rússia. Vemos isso nas transmissões de Tucker Carlson e Alex Jones.
A Estratégia Informacional da Rússia: Sobre as Variedades do Bolchevismo de Direita
A contaminação da direita por Moscou, através de infiltração e guerra psicológica, não começou ontem. Se examinarmos várias anomalias ideológicas em movimentos direitistas do passado, encontraremos tentativas persistentes de movimentos supostamente de direita se alinharem com a esquerda (consciente ou inconscientemente). O Nacional-Socialismo (ou seja, o movimento nazista) é geralmente considerado de direita, mas esse movimento era “socialista” e possuía um lado claramente esquerdista. Vemos hoje o apoio que Tucker Carlson e Alex Jones demonstram pela Rússia, e o apoio cada vez maior que a Rússia recebe dos seguidores do movimento MAGA de Trump.
Atrevemo-nos a fazer uma comparação ofensiva, já antecipada pelos teóricos do Iluminismo Sombrio, ao dizer que o Nacional-Socialismo chegou ao poder na Alemanha, em janeiro de 1933, porque Stálin ordenou ao KPD (Partido Comunista da Alemanha) que o permitisse. Teria Trump chegado ao poder porque o equivalente americano do KPD, por ordem de Putin, o permitiu? Muitos ficaram surpresos, em 1939, quando Hitler fez um pacto com Stálin – quando o bolchevismo e o nacional-socialismo se uniram para esmagar a Polônia. Alguém se surpreende, agora, ao ver Putin e Trump formarem uma espécie de pacto de não-agressão?
O apelido de Joseph Stálin para Hitler era “o quebra-gelo” da Revolução. O historiador russo Yuri Felshtinsky sugeriu que Donald Trump é o “quebra-gelo” de Vladimir Putin. Em termos de Stálin-Hitler e Putin-Trump, Felshtinsky traçou uma analogia estratégica bastante adequada. Mas isso é considerado tabu pelos neorreacionários, que dirão que Felshtinsky cometeu um reductio ad Hitlerum.
Foi Nick Land, ao analisar os textos de Curtis Yarvin, quem sugeriu que Hitler tornou-se um símbolo universal negativo contra o qual os fiéis do liberalismo devem sempre se unir, uma vez que o ódio a Hitler é obrigatório para “todos os homens de fé sã como o exato complemento do Deus encarnado (o anti-Messias revelado, ou Adversário), e essa identificação possui a força de uma ‘verdade autoevidente.’” Mas que tolo poderia deixar de perceber o paralelo óbvio entre Stálin-Hitler e Trump-Putin?
James B. Edwards, que escreveu um livro intitulado Hitler: Fantoche de Stálin, explicou: “Uma vez que os intelectuais se convenceram da corrupção essencial do sistema ocidental e da bondade essencial do sistema soviético, os detalhes deixaram de importar.” Podemos muito bem reescrever a frase de Edwards: “Uma vez que os comentaristas MAGA se convenceram da corrupção essencial do sistema ocidental e da bondade essencial do sistema russo sob Putin, os detalhes deixaram de importar.” O paralelo entre então e agora é quase exato. Alguém poderia escrever um livro intitulado Trump: Fantoche de Putin. Assim como Hitler imaginava uma aliança com Moscou contra a Polônia, Trump pode estar imaginando uma aliança com Moscou contra a China – ou até mesmo contra a Europa! Uma ideia incrivelmente estúpida, digna de escárnio. No entanto, este é o padrão do erro capital de Hitler, delineado por Ernst Topitsch em um notável livrinho intitulado A Guerra de Stálin: “Quando as coisas chegaram a um ponto crítico, Hitler trouxe a ruína sobre si mesmo ao não se afastar; em vez disso, tornou-se dependente de Moscou, com consequências desastrosas.”
Não estamos escrevendo aqui sobre o Holocausto. Não estamos comparando Hitler, o assassino em massa, a Trump, o astro de reality show. Estamos comparando Hitler, o estrategista que confiou em Moscou, a Trump, o estrategista que hoje confia em Moscou. Existem padrões de comportamento nas nações, na política externa, e devemos ter o direito de notá-los. Putin não sente vergonha de admirar Stálin, nem de imitá-lo. Eu sustento que Trump é ignorante demais para perceber que está imitando Hitler na escolha de seus aliados. Que os agentes de desinformação da Rússia perceberam essa semelhança entre Trump e Hitler como estrategistas é zombeteiramente refletido num pequeno volume intitulado Trumpismo Esotérico, que, em essência, mimetiza as blasfêmias sombrias do Hitlerismo Esotérico, de Miguel Serrano. A admissão de uma relação entre os dois volumes é feita francamente num site dughinista pró-Rússia, onde Trump é descrito como “uma figura mítica, arqueofuturista, navegando a batalha existencial do Ocidente por renascimento, unindo simbolismo esotérico e populismo moderno em uma busca apocalíptica por renovação.”
Arqueofuturista? Para compreender esse e outros termos pró-Rússia, é necessário ter lido os escritores russófilos do pós-Guerra Fria. Acredite ou não, um autor francês de direita chamado Guillaume Faye escreveu um livro intitulado Arqueofuturismo: Visões Europeias da Era Pós-Catástrofe, publicado na Europa durante os anos 1990 e traduzido para o inglês. O livro propunha a criação de um novo império eurasiático, no qual os países da Europa seriam reduzidos a meras províncias, e a nova nacionalidade seria a dos europeus brancos. Como Faye declarou a uma plateia de russos do Partido Nacional Popular, em 2005: “Acredito que a Rússia deve ser o centro de uma grande confederação branca. É o mesmo objetivo da sua organização.”
Assim como nos trabalhos de Nick Land e Curtis Yarvin, o livro de Faye se opõe ao “masoquismo étnico” da ideologia liberal dominante, que, segundo ele, é agravado pelo individualismo hedonista. Faye culpa o individualismo por “provocar uma explosão de práticas antinaturais: divórcios automatizados… rejeição do modelo da dona de casa… glorificação da homossexualidade [e uma]… queda demográfica causada pelo antinatalismo….” Faye prevê uma calamidade, embora não diga exatamente qual será. De fato, é verdade: o liberalismo de esquerda tornou-se um culto suicida de massas. Mas Faye não distingue entre as formas de liberalismo, tampouco observa que conservadorismo e liberalismo cresceram a partir do mesmo partido político inglês. Faye faz afirmações questionáveis e dogmáticas sobre o tema.
Estamos caminhando para o suicídio, diz Faye, porque a modernidade liberal é “baseada numa visão onírica da natureza humana e em uma antropologia falaciosa.” Contudo, Faye tem sua própria antropologia progressista falaciosa. Aparentemente crente no aquecimento global e em diversos alarmes ambientais, Faye se inquieta com a incompatibilidade entre muçulmanos afro-asiáticos e europeus num sentido nacional-socialista (ainda que sua nação declarada seja a Eurosibéria, com capital em Moscou). Ele acredita que uma explosão social está por vir, junto com tempos econômicos difíceis. O liberalismo está morto, afirma Faye, e o racionalismo do Iluminismo não tem qualquer futuro. “[O] mundo pós-catástrofe terá de reorganizar os tecidos sociais de acordo com princípios arcaicos – ou seja, humanos.”
E especificamente, o que essa reorganização implicará? Haverá o retorno da autoridade, é claro, e o retorno do poder familiar juntamente com “a subordinação dos direitos aos deveres.” Ele menciona vagamente a possibilidade de estruturas comunitárias, “o poder da hierarquia” e “o princípio da punição sobre a prevenção”, bem como “a reabilitação do princípio aristocrático.” A alma europeia, segundo ele, anseia pelo futuro, e anseia também por um Plano. Esse Plano implica a derrubada da ordem liberal. Por quê? “Porque a mentalidade igualitária e humanitária do homem moderno… não lhe permite lidar com as possibilidades explosivas da engenharia genética”, que Faye abraçaria. Estamos nos aproximando do dia em que a ciência será capaz de criar super-humanos e sub-humanos; e devemos abraçar essas novas criaturas, sugere Faye, erradicando os “pseudo-obstáculos éticos levantados contra a engenharia genética, a criação de seres humanos ‘modificados’ e a eugenia positiva.”
Faye é um idiota moral babão. A engenharia genética desse tipo sinalizaria o fim da humanidade. A ideia nasce da hybris, é claro, e nos remete à tragédia grega; exceto que Faye é um palhaço cuja silhueta se encaixa melhor na comédia vulgar. Ele pensa que pode, de forma arbitrária, criar sentido por conta própria — libertando-se da gaiola liberal. Joga fora todos os bebês com a água do banho; e usa alfinetes de fralda reaproveitados contra os globos oculares piscantes de seus leitores, à moda do vilão de Rei Lear, Lord Cornwall, que arrancou os olhos de Lord Gloucester gritando: “Fora, geleia vil!” Ser um idiota moral, e transmitir idiotice moral, sugere uma cegueira que deseja infligir cegueira a todos. Não há cegos piores do que os que querem arrancar os olhos de todos os outros.
“A grande fraqueza do sistema é que ele acredita que as pessoas são estúpidas,” escreve Faye, “e tenta narcotizá-las ou contorná-las por meios desajeitados — algo que acaba por cansar as pessoas e se mostrar ineficaz. A estratégia escolhida para conter ‘ideias perigosas’ foi desarmar todas as ideias, quaisquer que fossem….” É irônico, realmente, que Faye critique “o sistema” por acreditar que as pessoas são estúpidas enquanto ele mesmo advoga pela reprodução em massa de sub-humanos! Faye quer uma raça de criaturas estúpidas como escravos!
Faye brinca com ideias como uma criança brinca com fósforos. Ele é um incendiário, incendiando a criação de Deus para abrir caminho às abominações do homem. Sem ter senso real da história, reconhece, no entanto, que a modernidade é um caos insustentável, e que um retorno às formas antigas (com nova tecnologia) é inevitável. Sem senso de certo e errado, uma sociedade governada por homens como Faye deve se tornar totalitária. Deve tornar-se uma sociedade liderada por idiotas morais como ele mesmo. Ainda assim, ele reconhece que antigas formas de autoridade moral precisam ser restabelecidas.
“O arqueofuturismo,” ele escreve, “é um conceito de ordem, um conceito que perturba as mentes modernas, moldadas pela falaciosa ética individualista da emancipação e pela rejeição da disciplina que levou à fraude da ‘arte contemporânea’ e devastou os sistemas educacionais e socioeconômicos.” Faye é um revolucionário. Favoreceria Marx na medida em que Marx era antiburguês, mas reconhece que o marxismo, no momento, é impraticável. Alguma outra marca de ideologia antiburguesa precisa, portanto, ser improvisada. E assim, uma nova forma de teoria crítica emerge. Faye opõe-se —
“ao espírito fraco do humanitarismo, uma ética de fachada que eleva a ‘dignidade humana’ ao posto de dogma ridículo. Isso, sem mencionar a hipocrisia de tantas almas bem-intencionadas que ontem esqueceram de denunciar os crimes do comunismo e hoje nada têm a dizer sobre o embargo ao Iraque [1998] e a Cuba imposto pela superpotência americana … [e] a opressão dos palestinos.”
O que podemos dizer desse moralista com uma bússola moral quebrada? Sobre a religião, ele afirma que a modernidade supervisionou um processo de dessacralização e destruição dos valores transcendentes. Verdade. Mas será ele um mestre desses valores transcendentes por mérito próprio? Faye escreveu: “A tentativa fracassada de estabelecer religiões seculares, o desencantamento vazio criado por uma civilização que baseia sua legitimidade final no valor de troca e no culto ao dinheiro, e a autodestruição do cristianismo engendraram uma situação que não pode perdurar.” Se não formos cuidadosos, ele alerta, o Islã poderá se tornar a religião do futuro. Isso seria perigoso porque um Islã triunfante destruiria “a criatividade e a inventividade da alma europeia…”
Mas Faye usa uma cruz ao pescoço? Ele advoga por um retorno à Igreja Católica na França? Atacar o mercado está na moda, ficar do lado dos socialistas contra a burguesia é elegante, mas as pessoas precisam comprar e vender. Por que a prosperidade seria uma coisa ruim? Por um lado, ele favorece a criatividade, que o mercado sustenta; por outro, ataca o mercado e a liberdade econômica que, historicamente, fez da Europa um continente tão criativo e inventivo. E então, com uma reverência em direção a Moscou, Faye lamenta os planos maquiavélicos de certos estrategistas americanos, aos quais ele culpa pelo problema muçulmano da Europa.
Quão curioso é, de fato, que se culpe a América por um projeto essencialmente marxista; a saber, o projeto de subverter a sociedade ocidental por meio do rebaixamento da maternidade. Esse mau trato à maternidade, mais do que qualquer outra coisa, trouxe o Islã para dentro da Europa. Há alguma dúvida de que o feminismo causou a queda da taxa de natalidade europeia? Há alguma dúvida de que o feminismo foi sequestrado e usado pelo marxismo? À medida que a natalidade caía, a Europa teve de importar trabalhadores muçulmanos. Hoje, metade das crianças nas escolas de certas cidades europeias se chama Mohammed. Londres tornou-se Londonistão, e a Europa, Eurábia. E a culpa é da América? E os comunistas? Mas então Curtis Yarvin nos diria que a América é O PAÍS COMUNISTA ORIGINAL. Certo? Nunca mind aquele homem por trás da Cortina de Ferro!
E o que propõe Faye, como lacaio do Kremlin, como alternativa religiosa ao Islã? “A resposta arqueofuturista pode ser a seguinte,” explica Faye: “um cristianismo neo-medieval, quase politeísta, supersticioso e ritualizado para as massas, e um agnosticismo pagão — uma ‘religião de filósofos’ — para a elite.” Quanto à religião secular do “politicamente correto”, ele a considera etnicamente insincera, baseada em “esnobismo intelectual e covardia social.” Ele a chama de chique, suave e uma forma burguesa de stalinismo. Falar da ameaça islâmica à Europa é ser banido de restaurantes da moda e perder pontos diante das moças bonitas. “Ser politicamente correto não é questão de ideologia,” diz Faye, “mas de aceitação social.”
Faye acredita que a oposição atual ao politicamente correto também é politicamente correta. A rebeldia, diz ele, é neutralizada “por meio de rebeldia falsa.” Aqui, os politicamente corretos apenas se escondem sob a máscara da incorreção política. E assim se vão os conservadores. Quanto à liberdade de expressão, em vez de censura aberta temos uma mídia que opera por distração, focando em temas periféricos e entretenimento. O profissional da mídia almeja segurança e sabe como conquistar audiência com trivialidades. “O que temos aqui,” escreveu Faye, “não é simplesmente a brutalização habitual da população via o cada vez mais sofisticado aparato midiático de… espetáculo — um verdadeiro ‘prozac audiovisual’ — mas sim a ocultação de problemas políticos essenciais…”
Faye se refere à consulta e à negociação como os “flagelos da democracia moderna.” Ele diz que “Constantinopla está sob cerco e estamos debatendo o gênero dos anjos.” Embora sua intenção seja expressa de forma indireta, ele parece sugerir que o racismo e a intolerância do passado não eram inteiramente ruins; que o sistema de classes não era inteiramente opressivo; que a dominação masculina é um imperativo biológico. As velhas formas e instituições estão retornando, ele diz, queiramos ou não. É inegavelmente verdade que ele percebe o patriarcado em ressurgência. Naturalmente, homens duros estarão de volta à moda. Isso é inevitável. Mas mais do que isso, Faye acredita que uma guerra civil racial está a caminho da Europa.
Como Nick Land e Curtis Yarvin, Faye tem incitado supremacistas brancos e separatistas rumo a essa visão de futuro. Embora não tenha sido abertamente antissemita em seu livro, Faye favorecia o autoritarismo russo — ou deveríamos chamá-lo de totalitarismo? Faye apela ao “estoque nativo” europeu, advertindo que um dia esse povo reagirá violentamente contra o liberalismo, o igualitarismo e o Islã. Estes são, afinal, os fatores que estariam destruindo a civilização europeia. E quem se beneficia? Moscou, é claro. E quem, no fim das contas, é o culpado? Faye dizia que a culpa deve ser atribuída à economia liberal, ao individualismo hedonista e à América. É a permissividade engendrada pelos sistemas de mercado, ele explicou, que minou as estruturas autoritárias da civilização. O marxismo teve algo a ver com isso? Faye não se dispõe a dizer.
Quanto aos políticos “conservadores” e governos de direita, Faye diz que “sempre foram brandos. Têm medo do confronto e não ousam implementar as ideias e programas pelos quais chegaram ao poder…. Um governo de direita prefere não desagradar àqueles que votaram contra ele do que agradar a seu próprio eleitorado. Conquistar o favor da esquerda é o deleite da direita.” Verdade incontestável! Mas há aqui mais veneno do que aparenta. A democracia, diz ele, caminha inevitavelmente para o fracasso, e o surgimento de uma nova aristocracia é necessário (isto é, uma aristocracia vinda de Moscou). Tudo está irremediavelmente podre, e a Rússia possui a cura. O multiculturalismo, segundo ele, nada mais é do que multi-racismo. Agora todos vão realmente passar a odiar todos. Somente os americanos ainda possuem imaginação e visão épica. “Cultural, política e geopoliticamente, os americanos são fortes porque nós [europeus] somos fracos, ausentes, rígidos, e nos falta dinamismo e vontade. Deixemos de nos lamentar: a América apenas ocupa, de modo natural, o espaço que abandonamos.”
Isso nos conduz à conclusão de Faye — que tanto alegra o Kremlin. Ele aponta para o ocidente, para o que chama de “República Imperial Americana.” Afirma que o declínio da América “já foi ‘programado viralmente’ para o primeiro quarto do século XXI….” Em seguida, volta-se para o oriente, para a emergência do que ele denomina “Eurosibéria.” Segundo Faye, a França já não deveria mais ser chamada França. Esse não é seu nome verdadeiro, afinal. A França deveria retomar o nome que tinha sob o Império Romano e tornar-se doravante a província eurosiberiana da Gália. Para construir um império próprio, diz Faye, será preciso o surgimento de predadores que estejam “à espreita de um desastre histórico que faça sua presa emergir em pânico do matagal.” O predador, nesse caso, é a Rússia. A presa seriam os pequenos Estados burgueses da Europa.
“Na história humana,” diz Faye, “o estabelecimento de um complexo eurosiberiano representaria uma revolução maior que a da efêmera União Soviética ou mesmo que a dos Estados Unidos da América.” As razões dadas para justificar esse império, ele admite, são de pouca importância. A seu ver, uma Grande Europa deve necessariamente emergir. Faye chama as nações europeias de “agrupamento desordenado,” o que soa bastante chocante, já que o nacionalismo é o verdadeiro legado europeu, enquanto o Império Romano pereceu exatamente devido à sua decadência rumo ao despotismo oriental. A solução de Faye, então, é esse mesmo despotismo oriental apodrecido, agora centralizado em Moscou. O exemplo da ossificação progressiva do império romano, da asfixia econômica por decretos estatais, está claramente evidente de Diocleciano até culminar em Teodósio; mas tudo isso é completamente esquecido por Faye (se é que ele algum dia soube). E ainda assim, Faye celebra seu novo projeto imperial, com a Rússia no centro, como “Leviatã e Beemote fundidos em um só.” Segundo Faye, “Do porto de Brest a Port Arthur, de nossas ilhas geladas no Ártico ao sol vitorioso de Creta, dos campos da estepe e dos fiordes ao maquis, cem nações livres e unidas, reunidas para formar um império…” E ele atribui essa ideia ao ditador soviético Mikhail Gorbachev!
O livro de Faye foi publicado em 2010 pela Arktos Media Ltd., cujo nome vem do grego Arktos, ‘urso’; ou seja, o mesmo urso que simboliza o partido governante da Rússia, e que também aparece no nome de uma editora russa chamada ARKTOGEYA, e no site arcto.ru, onde a terminologia bolchevique e nacionalista é entrelaçada pelo “filósofo” geopolítico russo Alexander Dugin — que quase certamente está vinculado ao projeto de Faye (na medida em que Dugin também prega o estabelecimento de um império eurasiático). Um investigador perspicaz não pode deixar de ver uma conexão entre os diversos projetos da Arktos Media e da ARKTOGEYA, entre a editora de Faye e a de Dugin, entre Nick Land e Curtis Yarvin — entre o Trumpismo Esotérico e o Hitlerismo Esotérico. Por que não haveríamos de descobrir, a seu tempo, uma fonte comum de financiamento para todas essas curiosidades (bem como uma direção estratégica comum)?
Existe uma tendência peculiar de aliança entre o Vermelho e o Pardo, entre o comunista e o nacional-socialista — entre a Rússia e o movimento MAGA. Devemos nos preocupar? Ou deveríamos descartar tais preocupações como simples reduções ao Hitlerismo, como sugeriu Nick Land? Lembremo-nos de que as políticas suicidas não provêm apenas da esquerda. Tais políticas também podem vir da direita. O suicídio societal está no ar quando direita e esquerda começam a cooperar rumo a um mesmo fim autoritário. Meu argumento é que a política da Alemanha nazista foi uma política de suicídio nacional. Hitler cometeu suicídio ao se alinhar com Moscou em 1939, desencadeando uma guerra mundial. A retórica pró-Rússia de Faye e Dugin, Land e Yarvin, soa o mesmo alarme. É o sino do suicídio nacional.
Em maio de 2005, Faye declarou o seguinte a membros do Partido Nacional do Povo na Rússia:
“Frequentemente me perguntam se sou racista. Se sou nazista. Não. Meu conceito é: sou contra a guerra. Não quero conquistar a Argélia. Mas se eles nos atacarem, devem ser destruídos…. Portanto, concordo plenamente com os ensinamentos do russoísmo. Acredito que a Rússia deve ser o centro de uma grande confederação branca. É o mesmo objetivo da sua organização [o Partido Nacional do Povo].”
Comentando essa retórica, um pesquisador ucraniano me disse:
“Isso é teatro. Eles querem criar uma atmosfera nazista sem o estigma nazista. Estão explorando a ideia emocional de que Hitler quase libertou a Rússia do bolchevismo. É por isso que muitos anti-soviéticos nutrem essa simpatia inconsciente por Hitler. Os tolos serão guiados por essas emoções.”
A citação dentro da citação contém uma admissão surpreendente. É uma admissão que não deve passar despercebida. É preciso compreender que hoje já existem métodos, no campo da guerra psicológica, capazes de conduzir a direita e a esquerda ao mesmo desfecho. O que vemos atualmente são duas variedades de retórica, ambas tendendo ao mesmo resultado, ambas conectadas a um mesmo sistema secreto.
Os leitores deveriam observar com atenção as imagens e os símbolos do Partido Nacional do Povo no site nnpr.su. Segundo a Wikipédia, o Partido Nacional do Povo teria sido fundado por Aleksandr Ivanov-Sukharevsky com o auxílio de dois veteranos das Centenas Negras. Ivanov-Sukharevsky teria se aliado a Semyon Tokmakov, líder de um grupo skinhead. Curiosamente, os dois grandes heróis do Partido Nacional do Povo são o czar Nicolau II e Adolf Hitler.
Poder-se-ia dizer que essa mistura bizarra de personalidades e causas tão díspares é um subproduto de uma abordagem experimental à adaptação política, talvez supervisionada pelos serviços especiais de um certo país (GRU, SVR). Por mais intrigantes ou brilhantes que pareçam as formulações ideológicas apresentadas por autores como Faye, o caráter que as sustenta não pode deixar de revelar uma descarada ausência de sensibilidade moral. Essa mesma insensibilidade moral também se encontra em ideólogos americanos como Tucker Carlson e Alex Jones.
Foi assim tão escandaloso, então, que há alguns anos Yuri Felshtinsky tenha escrito: “Talvez descubramos que Donald Trump, entre 2017 e 2021, foi uma versão ‘jovem’ de Hitler — e que a versão ‘velha’ ainda está por vir”? Certamente, essa afirmação me causou desconforto à época. Muitos de nós ainda nutríamos a esperança — contra toda a esperança — de que Trump se opusesse à agenda socialista, salvando nossa nação da insanidade esquerdista. Como poderíamos saber que Trump representava um outro tipo de insanidade?
A forma que a abordagem de Trump assumiu é fundamental — especialmente em relação à imigração — e foi rotulada como “racista” pela esquerda. A maioria de nós ignorou os alertas da esquerda porque estávamos cansados de sermos chamados de racistas. Mas a direção ideológica de Trump agora parece inevitavelmente destinada a romper com a Constituição, à semelhança do ditador de direita imaginado em Origins of the Fourth World War. Esse ditador, descrito como moralmente questionável, seria uma figura emergente após a Terceira Guerra Mundial. Jamais imaginei que ele poderia surgir antes.
Esse ditador era retratado como um militar. Nunca o imaginei como um homem de negócios. Ele seria, de fato, um inimigo declarado da China, embora ambivalente em relação à Rússia (como aparece no texto de Origins). O “Arquegeneral” seria um “ditador de Pólo a Pólo”, num mundo dividido entre os Estados beligerantes da Rússia, da China e da América. Seria um César amoral, assassino, um maquiavélico convocado pela “política de furacão” da guerra de destruição em massa. Nunca me ocorreu que tal tipo amoral pudesse surgir antes de uma guerra de destruição global; que a desorientação interna da América fosse suficiente para permitir o surgimento de tal figura.
Os estrategistas-filosóficos do cérebro global do Kremlin merecem algum crédito. A destruição que será desencadeada na próxima guerra mundial deve muito à engenhosidade deles. Como compreender essas pessoas? Eles nem mesmo são ideólogos. Eles reconheceram o que escrevi pela primeira vez em 1987:
“A direita é uma ficção. Todos estão na esquerda.”
Eis o segredo sujo que alimenta o jogo neo-reacionário. Os agentes de influência de Moscou sabem que a direita nunca foi séria e careceu de confiança. Mais do que isso, a direita é desatenta. Como poderia a direita compreender o comunismo, se nem sequer compreende a si mesma?
O grande dissidente russo Vladimir Bukovsky tentou alertar seus amigos conservadores:
“O comunismo é complicado.”
Mas nossos neoconservadores, libertários e paleoconservadores queriam uma resposta “fast-food”, com seu hambúrguer e batata frita. Quando você tenta explicar o comunismo a eles, dizia Bukovsky, os olhos se perdem no vazio. Afinal, o comunismo está repleto de armadilhas e mal-entendidos — especialmente para pessoas superficiais. Essas pessoas superficiais, esses conservadores americanos, não poderiam ter vencido a Guerra Fria. É ridículo pensar que venceram. Eram superficiais demais para entender o que enfrentavam. Não refletiram o suficiente, nem com a devida profundidade, sobre o pacto Hitler-Stalin e seu verdadeiro significado.
O que, então, é o comunismo? Uma filosofia? Um partido político? Um Estado policial? Um sistema econômico? Uma revolução? O esvaecimento do Estado? Tudo isso? Nenhum desses?
Desde o início, tem sido um amontoado de contradições que se alimenta da própria contradição. E há, ainda, a psicologia criminosa por trás disso — o crime organizado que se manifesta por meio disso. Os partidos comunistas se aproveitam do capitalismo, do socialismo e até mesmo da democracia, quando lhes convém. Mas o elemento constante é o mentir, o roubar e o matar. Vimos isso com Stálin, Mao, Putin e Xi. A mentira é hoje mais espetacular do que nunca — o que sugere que o número final de mortos também será mais espetacular.
A complexidade do comunismo (ou do chamado socialismo), em todos os seus aspectos, nos deixou numa situação onde ninguém conseguiu realmente explicar como essa coisa funciona. Hannah Arendt usou o termo “totalitarismo”, no qual incluiu o Nacional-Socialismo. Eric Voegelin escreveu sobre o “gnosticismo”. Igor Shafarevich e Gustave Le Bon preferiam o termo “socialismo”, enquanto Carl Jung falava de um movimento do Anticristo ao longo da história. Todos perceberam que se tratava de algo maligno. Cada um usou uma terminologia diferente. Mas todos estavam descrevendo o mesmo fenômeno.
Marx dizia a seus amigos mais próximos que ele não era marxista — que não havia um dogma marxista. Essa ideia foi reiterada por Lênin. E foi uma ideia que Stálin agarrou com força. Hoje, Putin voa livremente pelos céus, como um foguete nuclear, guiado por esse mesmo entendimento. Cada estátua de Lênin, em cada cidade russa, permanece intacta.
Mao Tsé-Tung disse, famosamente, que o marxismo-leninismo era mais poderoso “do que uma metralhadora.” Disse também que era “mais poderoso do que a bomba atômica.” Veja bem: o marxismo não era uma ideologia. O marxismo era uma arma. O leninismo era uma arma. A própria ideologia é uma arma. As narrativas — como hoje podemos perceber — são armas! E assim, Lênin permanece em seu mausoléu. Estátuas de Stálin estão sendo erguidas por toda a Rússia. Os velhos ídolos retornam — e são reverenciados. Por quê? Porque foram perversamente imaginativos e estrategicamente bem-sucedidos. O que sempre se exige, repetidas vezes, é imaginação. Sempre esperamos que os homens bons tenham mais imaginação do que os maus. Mas aqui, os maus superaram os bons. E agora que quase todos são idiotas, estamos nos precipitando para o ato final.
Há mais de cem anos, Lênin escreveu que o comunismo só poderia triunfar se o comunista se tornasse “um líder prático das massas na revolução.” Explicou que o líder revolucionário deveria aliar a devoção ao comunismo com:
“a capacidade de realizar todos os compromissos práticos necessários, desvios, manobras conciliatórias, ziguezagues, recuos e assim por diante, a fim de acelerar a conquista — e depois a perda — do poder político pelos [políticos pró-capitalistas] … para acelerar sua inevitável falência prática … para acelerar os inevitáveis atritos, disputas, conflitos e a completa desintegração entre [os políticos pró-capitalistas] … para escolher o momento certo, quando a discórdia entre esses ‘pilares da sagrada propriedade privada’ estiver em seu auge, de modo que, por meio de uma ofensiva decisiva, o proletariado os derrote a todos e conquiste o poder político.”
(Esquerdismo: Doença Infantil do Comunismo)
Lênin dizia que o doutrinismo deveria ser refutado nessas questões, porque há “uma maravilhosa variedade de formas em constante mudança… e, portanto, todas as razões para esperar uma recuperação rápida e completa do movimento comunista internacional da doença infantil do ‘esquerdismo’.”
O que temos hoje na direita é um problema que Lênin enfrentou na Rússia. Os comunistas não estavam mentalmente preparados para governar um país de verdade em 1917. Seu pensamento era estreito demais. Tratavam a teoria política como uma religião, onde o que importava era crer. Hoje, o mesmo problema aflige a direita americana. Quase todos aderem a más teorias — a um pensamento ideológico. Muitos sustentam dogmas rígidos sem sequer conhecer o básico.
A direita (no contexto conservador americano) é, por definição, a defensora das estruturas existentes. Não deveria ser revolucionária ou neorreacionária. Deveria ser cuidadosa, constante e gradualista. Mas todos se esqueceram de Edmund Burke. As teorias que agora estão sendo defendidas são perigosas. As políticas que decorrem dessas teorias também são perigosas. Os estrategistas de Moscou esfregam as mãos de satisfação.
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